de Brad Bird
Brad Bird é um senhor animação, o maior génio do género que Hollywood vê a trabalhar desde que o Rob Minkoff e o Roger Alles provaram que, afinal, O Rei Leão teve mais de trabalho de equipa que das suas próprias mentes. Bird no entanto é cada vez o único pioneiro da animação de autor, é ele o criador de um dos filmes animados, infelizmente, mais esquecidos de sempre, O Gigante De Ferro, e de uma das grandes obra-primas dos estúdios Pixar, Os Invencíveis. E dizer ali que é um dos melhores filmes do estúdio é dizer muito visto que eu, de todas as longa-metragens já lançadas por eles, só ponho Carros de parte (sim, bom filme mas muito abaixo do que a lâmpada animada nos habituava). Mas antes de se ser esta revelação, Brad Bird era uma jovem promessa que aprendeu muito com a equipa de Groening nos The Simpsons (onde ele foi parte integrante da melhor temporada que a série já viu, a quarta) e argumentista apadrinhado por Steven Spielberg que pegou nele para a sua série Amazing Stories e aquele pequeno filme amoroso que ainda está presente na minha infância - Batteries Not Included. Ele merece todos os elogios que eu lhe possa dar, ninguém devolve ao cinema fantástico aquele olhar generoso e respeitador que me lembro de quando via filmes com seis ou sete anos. Ver um filme do Bird é, para mim, rever o E.T. com o Regresso Ao Futuro em sessão dupla, é a professora estar doente e a turma ficar na sala a ver Bernardo e Bianca na Cangurulândia, é relembrar o que me fez apaixonar por cinema ainda mal eu sabia o que era o cinema na realidade, antes de desenvolver o meu gosto e descobrir a génese da arte. Bird é o percursor desse cinema clássico norte-americano em estado puro que já tinha sido perdido pelos estúdios de animação mais interessados em repetir o modelo Shrek ad nauseum de atirar o gag à parede para ver se os putos se riem e aborrecer de morte o pai que os leva ao cinema. A verdade é que as crianças não são parvas, quem fez os clássicos da Disney (80% do que produziram na animação até ao Pocahontas) sabia isso, a Pixar sabe isso, os estúdios Aardman sabem isso mas ninguém o sabe tão bem como Brad Bird que puxa os seus limites em cada filme e está obcecado em trazer uma verdadeira experiência cinematográfica a todos os que se queiram entregar.
O salto que ele dá com este novo trabalho é, no entanto, revelador das capacidades infinitas de Bird. The Incredibles já era uma obra-prima, caro senhor, e quem viu ainda hoje se encanta quando fala de Iron Giant. Não era preciso provar nada, não era preciso nos dar um dos melhores filmes de animação da década que batalhará lado-a-lado com os maiores clássicos do cinema animado. Ratatouille é uma elogia ao bom gosto, passando o trocadilho com a história do filme, um pedaço pontuado por momentos mágicos daqueles que me voltavam a transportar ao tempo em que vi pela primeira vez Elliot na bicicleta a voar com a lua no fundo. E é acima de tudo respeito pelo espectador que pagou para ver um filme e não um saco de piadas e um filme levou para casa. E que filme. Que filme...
Contado pela voz de Remy, um rato do campo com um evoluído sentido de gosto e de cheiro e cujo herói é um histórico mestre de cozinha francês que luta contra o elitismo ao tentar convencer o mundo inteiro que toda a gente pode cozinhar. Remy separa-se do seu clã, do seu pai e irmão que não apoiam o interesse de Remy, e vê-se sozinho em Paris justamente debaixo do restaurante do falecido cozinheiro herói de Remy. Quando o rato de junta a um rapaz de limpezas que começou agora mesmo a trabalhar na cozinha, sai de lá uma amizade inesperada entre um rato que sabe cozinhar e um rapaz que...saber ser humano. Juntos tentam impedir o novo chefe de cozinha do restaurante de denegrir a imagem do histórico falecido e devolver ao restaurante as estrelas que merece tentando convencer o crítico Ego, cujo nome explica tudo sobre a personagem.
Não é o perfeitamente estruturado argumento nem a simpatia que temos pelas personagens que fazem desde Ratatouille um vencedor nato. É Bird que, qual mel para cinéfilos, nos dá algumas das mais belíssimas cenas que este ano verá. Remy a descobrir que está em Paris, Remy a tentar escapar-se dos perigos da cozinha e, principalmente, aquele magnífico final narrado por Peter O'Toole são um deleite para os sentidos e quantas vezes quiserem mais eficaz que qualquer posta de gags atirados ao público. Ainda mais notável é Bird saber não cair no dogmatismo norte-americano de "num filme para crianças não se deve mostrar isto ou aquilo", a tensão sexual entre Linguini e Colette está longe do livro de regras do produtor preocupado com os valores de família, a bebedeira de Linguini e consequente ressaca e mesmo próprio animal escolhido, o rato, que aqui não é limpo e caricaturado mas sujo, parasita e preparado para enfiar os dentes num pedaço de lixo homogéneo que, é de mim, ou se parecia um pouco com os hamburgueres de cadeias fast-food?
Ratatouille é de longe um dos melhores filmes deste ano e nem que apareçam 20 Casablancas até ao fim não acredito que lhe tirarão esta honra. O Óscar para a categoria está mais que dado, Bird deverá levar e impressiona tanto que me deixa mais do que nunca desejoso de ver o seu próximo projecto.
Tuesday, 23 October 2007
Tuesday, 9 October 2007
Superbad (2007)
de Greg Mottola
O "Jewpack" começou em 1999 quando Judd Apatow criou uma das mais brilhantes comédias de adolescentes que a televisão norte-americana. Infelizmente o mundo ainda não estava preparado e Freaks & Geeks foi infelizmente cancelado, mas Apatow tinha conseguido juntar um grupo de pessoas encabeçadas pelo multi-talentoso Seth Rogen e só precisaríamos de uns anos para que ele chegasse ao cinema com uma das comédias mais injustamente esquecidas no nosso país, 40-Year Old Virgin com um Steve Carell a começar a sua carreira no grande ecrã. O grupo volta atacar com a junção de alguns da equipa de outra fabulosa série de comédia norte-americana também cancelada prematuramente, Arrested Development, e o resultado chegou este ano. Esta produzida por Apatow e escrita por Rogen sai ao mesmo tempo que outro filme, Knocked Up, realizado por Apatow e protagonizada por Rogen e as duas (ainda não vi esta segunda) tomaram o verão norte-americano batendo os muito antecipados blockbusters e terceiros capítulos de sagas já edificadas e multi-milionárias.
A receita está no humanismo do "jewpack" que não para de nos surpreender na incisão das suas narrativas. Os filmes são feitos com o maior respeito pelas suas personagens e a tentativa de evitar em cair em lugares-comum, saída tão fácil para as comédias adolescentes. Sem seguir a linha do escatológico, Superbad é tudo aquilo que Judd Apatow e o seu grupo sempre nos habituaram e só essa simplicidade que eles nos costumam dar devia ser mais que motivo para que se começasse, de uma vez por todas, a dar valor a estes pioneiros da nova comédia americana.
A história segue um dia de dois rapazes, dois grandiosos Michael Cera e Jonah Hill, enquanto tentam arranjar álcool para uma festa para assim conquistar as raparigas-alvo para as suas primeiras experiências sexuais. A premissa parece ser American Pie de regresso, mas o argumento de Seth Rogen e as fabulosas interpretações de Cera, Hill e a grande revelação Christopher Mintz-Plasse (no já histórico McLovin) não deixam o filme ser apenas e só a premissa e ainda estamos nos créditos iniciais e já fica a sensação que existe algo de novo, quando o primeiro diálogo arranca, Jonah ao telefone com o Michael sobre que site porno ele se vai inscrever, a chapada de sinceridade ataca o espectador. Todas as personagens que aqui estão não são apenas imagens dos elementos da nossa adolescência nem ninguém se comporta daquela forma tão vã e desinteressante que Hollywood tanto gosta de apelas: não há feios nem bonitos, nem gordos nem magros, todas as personagens são iguais a si mesmas logo iguais a nós próprios. As mesmas inseguranças, o mesmo desespero de quem já teve 16 anos e as mesmas conversas repletas de linguagem menos própria porque, no fim, é assim que todos nós somos.
Apatow é só o produtor mas o espírito dele flutua na obra inteira como se ele confirmasse o seu estatuto de guro. No entanto é Rogen que, como argumentista e no papel de um dos polícias amigos de Fogell (McLovin a.k.a. Mintz-Plasse), se revela. O seu argumento é dos mais simples e sinceros que já se viu num filme de adolescentes desde o histórico The Breakfast Club de John Hughes e o seu sentido de humor é tão exagerado que tudo o que sai da boca de Jonah Hill parece ter saído, um dia, da de Seth Rogen.
Superbad está na pole-position das melhores comédias do ano. Acredito que muita gente não queira admitir o seu valor por ele atravessa aquela ténue linha de todos os outros filmes de adolescentes, mas nenhum deles tem o humanismo deste e nenhum deles admite que a temática principal é sexo porque quando estamos naquela idade não pensamos noutra coisa.
Salvé Apatow e o seu grupo. Quem ainda não os segue com devoção, que comece. Eu já aderi ao clube de fãs há muito tempo.
O "Jewpack" começou em 1999 quando Judd Apatow criou uma das mais brilhantes comédias de adolescentes que a televisão norte-americana. Infelizmente o mundo ainda não estava preparado e Freaks & Geeks foi infelizmente cancelado, mas Apatow tinha conseguido juntar um grupo de pessoas encabeçadas pelo multi-talentoso Seth Rogen e só precisaríamos de uns anos para que ele chegasse ao cinema com uma das comédias mais injustamente esquecidas no nosso país, 40-Year Old Virgin com um Steve Carell a começar a sua carreira no grande ecrã. O grupo volta atacar com a junção de alguns da equipa de outra fabulosa série de comédia norte-americana também cancelada prematuramente, Arrested Development, e o resultado chegou este ano. Esta produzida por Apatow e escrita por Rogen sai ao mesmo tempo que outro filme, Knocked Up, realizado por Apatow e protagonizada por Rogen e as duas (ainda não vi esta segunda) tomaram o verão norte-americano batendo os muito antecipados blockbusters e terceiros capítulos de sagas já edificadas e multi-milionárias.
A receita está no humanismo do "jewpack" que não para de nos surpreender na incisão das suas narrativas. Os filmes são feitos com o maior respeito pelas suas personagens e a tentativa de evitar em cair em lugares-comum, saída tão fácil para as comédias adolescentes. Sem seguir a linha do escatológico, Superbad é tudo aquilo que Judd Apatow e o seu grupo sempre nos habituaram e só essa simplicidade que eles nos costumam dar devia ser mais que motivo para que se começasse, de uma vez por todas, a dar valor a estes pioneiros da nova comédia americana.
A história segue um dia de dois rapazes, dois grandiosos Michael Cera e Jonah Hill, enquanto tentam arranjar álcool para uma festa para assim conquistar as raparigas-alvo para as suas primeiras experiências sexuais. A premissa parece ser American Pie de regresso, mas o argumento de Seth Rogen e as fabulosas interpretações de Cera, Hill e a grande revelação Christopher Mintz-Plasse (no já histórico McLovin) não deixam o filme ser apenas e só a premissa e ainda estamos nos créditos iniciais e já fica a sensação que existe algo de novo, quando o primeiro diálogo arranca, Jonah ao telefone com o Michael sobre que site porno ele se vai inscrever, a chapada de sinceridade ataca o espectador. Todas as personagens que aqui estão não são apenas imagens dos elementos da nossa adolescência nem ninguém se comporta daquela forma tão vã e desinteressante que Hollywood tanto gosta de apelas: não há feios nem bonitos, nem gordos nem magros, todas as personagens são iguais a si mesmas logo iguais a nós próprios. As mesmas inseguranças, o mesmo desespero de quem já teve 16 anos e as mesmas conversas repletas de linguagem menos própria porque, no fim, é assim que todos nós somos.
Apatow é só o produtor mas o espírito dele flutua na obra inteira como se ele confirmasse o seu estatuto de guro. No entanto é Rogen que, como argumentista e no papel de um dos polícias amigos de Fogell (McLovin a.k.a. Mintz-Plasse), se revela. O seu argumento é dos mais simples e sinceros que já se viu num filme de adolescentes desde o histórico The Breakfast Club de John Hughes e o seu sentido de humor é tão exagerado que tudo o que sai da boca de Jonah Hill parece ter saído, um dia, da de Seth Rogen.
Superbad está na pole-position das melhores comédias do ano. Acredito que muita gente não queira admitir o seu valor por ele atravessa aquela ténue linha de todos os outros filmes de adolescentes, mas nenhum deles tem o humanismo deste e nenhum deles admite que a temática principal é sexo porque quando estamos naquela idade não pensamos noutra coisa.
Salvé Apatow e o seu grupo. Quem ainda não os segue com devoção, que comece. Eu já aderi ao clube de fãs há muito tempo.
Saturday, 6 October 2007
Cinema Sul-Coreano
The Isle (2001)
de Kim Ki Duk
No começo do novo século era o cinema japonês que andava a mexer com o mundo. Não só no género do terror cujas novas normas foram inventadas pelo país do sol nascente (e desde então repetidas em todo o lado ad nauseum) mas também no reconhecimento crítico noutros pontos desde que Takeshi Kitano refazia os filmes dos yakuza no anos 90. A Coreia do Sul era apenas a "irmã mais nova"que se limitava a tentar aparecer no renascido mercado asiático. Não foi preciso esperar muito tempo para que o sul-coreanos chegassem à pole-position, se revelassem mais inovadores e são agora vários os realizadores desse país que os amantes do cinema asiático seguem com devoção, e cada vez menos artistas japoneses na lista.
Um dos pioneiros foi Kim Ki Duk que com este O Bordel Do Lago (triste título português dado, provavelmente, por quem não prestou atenção ao filme) anúncio a sua incursão pelo ecrãs mundiais numa carreira que até agora só se prova como muito bem sucedida.
A maior curiosidade foi como este filme entrou no mercado internacional, dentro de pacotes de cinema fantástico, que mais tarde, com os filme seguintes de Ki Duk, o catálogo seria provado erróneo quanto à verdadeira natureza do realizador. Compreendo porquê, no mesmo ano audition de Takashi Miike estava a fazer os mesmos festivais e as comparações entre os dois eram inevitáveis - os dois são duas histórias de amor condenado pautado por várias cenas de mutilação e tudo com um background daquela sensibilidade asiática que parece por vezes inatingíveis para nós, europeus.
A diferença entre os dois prova, no entanto, que o sul-coreano não se iria ficar pelos filmes de culto fantástico: os sentimentos das personagens de Ki Duk são centrais à narrativa e as cenas de mutilação somente consequências das suas acções.
Passado num enorme lago na Coreia do Sul onde homens se retiram para pequenas casinhas flutuantes espalhadas pelo centro do mesmo, Seom segue a jovem rapariga muda que trata dos ricos pescadores - leva-os para as suas respectivas casas no seu pequeno barco, transporta as prostitutas que eles encomendam por uma noite e por vezes dá ela favores sexuais por uns trocos mais. A chegada de um homem misterioso que não vai lá para pescar muda a rotina dela que se começa a apaixonar por ele aos bocados. E enquanto o tempo passa e eles se vão entre ajudando acabam por descobrir até onde são capazes de se auto-sacrificarem para que se possam escapar das consequências dos seus actos.
A falta de diálogos pelas personagens principais leva a acreditar que para Ki Duk a palavra é um bem desnecessário, quando o próprio protagonista descobre isso executa uma acção chocante que não por salva a sua vida como o aproxima da rapariga. Mas é Ki Duk quem prega essa filosofia, o seu filme é contemplativo mesmo em cenas de violação ou quando as personagens usam anzóis para outra coisa que não pescar.
Mas poderoso é o final, o último plano deixa o público a coçar a cabeça com a metáfora apresentada. Ki Duk gere tão bem a história que quando nos dá aquela conclusão obriga-nos a uma reflexão sobre o sacrifício espontâneo numa belíssima conclusão para esta história contemplativa.
Oldboy (2003)
de Chan-wook Park
Foi já há quatro anos que o cinema sul-coreano se edificou nas massas de uma forma que nem os contemporâneos japoneses tinha conseguido. E a grande confirmação foi este tour-de-force que já foi tão falado e escrito que é difícil encontrar alguém que goste de cinema que nunca tenha visto este segundo capítulo da trilogia da vingança de Park.
Baseado num manga japonês, Oldboy segue Oh Dae Su desde o dia em que é raptado nos anos 80, encarcerado num pequeno quarto, libertado 15 anos depois e a procura da vingança pelo responsável desse acto barbárico que o destruiu a sua vida. Mascarado pela vingança cega de Dae Su (cuja complexa resolução final revela um ainda maior acto de vingança do prevaricador final) o filme contrasta as duas Coreias-do-Sul, a sub-desenvolvida dos anos 80 e a nova moderna quase grande potência económica mundial. Com reflexos da antiga subjugação japonesa, a nova Coreia Do Sul é um local desconhecido para Dae Su da mesma forma que é para quem ainda se lembra do jovem país ocupado por forças japonesas antes da IIª Grande Guerra e como o país que renasceu das cinzas ainda guarda um certo rancor pelo passado, ironia das ironias, esta história-reflexo da Coreia parte uma premissa escrita por japoneses.
Ao longo dos anos Oldboy tem percorrido o mundo e encontrado fãs em todo o lado. De Tarantino que deu a Park o Grande Prémio do Júri em Cannes ao fenómeno criado por novos cinéfilos que elevaram este filme não só ao culto mas também ao panteão dos melhores filmes desta nova década. Dou-lhe todo o valor, claro. A dureza, e principalmente, frieza da história é elevada ao cubo na personagem de Dae Su, um protagonista que nem na categoria de anti-herói se consegue inserir é um bêbado desgraçado no começo e termina como alguém sem valores nenhuns cuja decisão final acaba por ser muito mais chocante que o próprio twist que o espera antes. Aliás, de certa forma é o vilão quem mais simpatia traz ao público, a dor que o atravessa é bem mais forte que a de Dae Su e a sua conclusão mais honorável.
Que dizer mais? Oldboy pôs definitivamente a Coreia do Sul no mapa e até agora nenhuma outra cinematografia asiática é tão excitante quanto a do sul da pequena península.
de Kim Ki Duk
No começo do novo século era o cinema japonês que andava a mexer com o mundo. Não só no género do terror cujas novas normas foram inventadas pelo país do sol nascente (e desde então repetidas em todo o lado ad nauseum) mas também no reconhecimento crítico noutros pontos desde que Takeshi Kitano refazia os filmes dos yakuza no anos 90. A Coreia do Sul era apenas a "irmã mais nova"que se limitava a tentar aparecer no renascido mercado asiático. Não foi preciso esperar muito tempo para que o sul-coreanos chegassem à pole-position, se revelassem mais inovadores e são agora vários os realizadores desse país que os amantes do cinema asiático seguem com devoção, e cada vez menos artistas japoneses na lista.
Um dos pioneiros foi Kim Ki Duk que com este O Bordel Do Lago (triste título português dado, provavelmente, por quem não prestou atenção ao filme) anúncio a sua incursão pelo ecrãs mundiais numa carreira que até agora só se prova como muito bem sucedida.
A maior curiosidade foi como este filme entrou no mercado internacional, dentro de pacotes de cinema fantástico, que mais tarde, com os filme seguintes de Ki Duk, o catálogo seria provado erróneo quanto à verdadeira natureza do realizador. Compreendo porquê, no mesmo ano audition de Takashi Miike estava a fazer os mesmos festivais e as comparações entre os dois eram inevitáveis - os dois são duas histórias de amor condenado pautado por várias cenas de mutilação e tudo com um background daquela sensibilidade asiática que parece por vezes inatingíveis para nós, europeus.
A diferença entre os dois prova, no entanto, que o sul-coreano não se iria ficar pelos filmes de culto fantástico: os sentimentos das personagens de Ki Duk são centrais à narrativa e as cenas de mutilação somente consequências das suas acções.
Passado num enorme lago na Coreia do Sul onde homens se retiram para pequenas casinhas flutuantes espalhadas pelo centro do mesmo, Seom segue a jovem rapariga muda que trata dos ricos pescadores - leva-os para as suas respectivas casas no seu pequeno barco, transporta as prostitutas que eles encomendam por uma noite e por vezes dá ela favores sexuais por uns trocos mais. A chegada de um homem misterioso que não vai lá para pescar muda a rotina dela que se começa a apaixonar por ele aos bocados. E enquanto o tempo passa e eles se vão entre ajudando acabam por descobrir até onde são capazes de se auto-sacrificarem para que se possam escapar das consequências dos seus actos.
A falta de diálogos pelas personagens principais leva a acreditar que para Ki Duk a palavra é um bem desnecessário, quando o próprio protagonista descobre isso executa uma acção chocante que não por salva a sua vida como o aproxima da rapariga. Mas é Ki Duk quem prega essa filosofia, o seu filme é contemplativo mesmo em cenas de violação ou quando as personagens usam anzóis para outra coisa que não pescar.
Mas poderoso é o final, o último plano deixa o público a coçar a cabeça com a metáfora apresentada. Ki Duk gere tão bem a história que quando nos dá aquela conclusão obriga-nos a uma reflexão sobre o sacrifício espontâneo numa belíssima conclusão para esta história contemplativa.
Oldboy (2003)
de Chan-wook Park
Foi já há quatro anos que o cinema sul-coreano se edificou nas massas de uma forma que nem os contemporâneos japoneses tinha conseguido. E a grande confirmação foi este tour-de-force que já foi tão falado e escrito que é difícil encontrar alguém que goste de cinema que nunca tenha visto este segundo capítulo da trilogia da vingança de Park.
Baseado num manga japonês, Oldboy segue Oh Dae Su desde o dia em que é raptado nos anos 80, encarcerado num pequeno quarto, libertado 15 anos depois e a procura da vingança pelo responsável desse acto barbárico que o destruiu a sua vida. Mascarado pela vingança cega de Dae Su (cuja complexa resolução final revela um ainda maior acto de vingança do prevaricador final) o filme contrasta as duas Coreias-do-Sul, a sub-desenvolvida dos anos 80 e a nova moderna quase grande potência económica mundial. Com reflexos da antiga subjugação japonesa, a nova Coreia Do Sul é um local desconhecido para Dae Su da mesma forma que é para quem ainda se lembra do jovem país ocupado por forças japonesas antes da IIª Grande Guerra e como o país que renasceu das cinzas ainda guarda um certo rancor pelo passado, ironia das ironias, esta história-reflexo da Coreia parte uma premissa escrita por japoneses.
Ao longo dos anos Oldboy tem percorrido o mundo e encontrado fãs em todo o lado. De Tarantino que deu a Park o Grande Prémio do Júri em Cannes ao fenómeno criado por novos cinéfilos que elevaram este filme não só ao culto mas também ao panteão dos melhores filmes desta nova década. Dou-lhe todo o valor, claro. A dureza, e principalmente, frieza da história é elevada ao cubo na personagem de Dae Su, um protagonista que nem na categoria de anti-herói se consegue inserir é um bêbado desgraçado no começo e termina como alguém sem valores nenhuns cuja decisão final acaba por ser muito mais chocante que o próprio twist que o espera antes. Aliás, de certa forma é o vilão quem mais simpatia traz ao público, a dor que o atravessa é bem mais forte que a de Dae Su e a sua conclusão mais honorável.
Que dizer mais? Oldboy pôs definitivamente a Coreia do Sul no mapa e até agora nenhuma outra cinematografia asiática é tão excitante quanto a do sul da pequena península.
Friday, 5 October 2007
Obituário
Morreu Charles B. Griffith
O escriba de vários filmes de série B trabalhou com o mestre Roger Corman em clássicos como The Little Shop Of Horrors original e Bucket Of Blood e ainda um dos co-autores de Death Race 2000. Há mais de uma década que não apresentava novos trabalhos mas o mundo da cinefilia está de luto em honra deste argumentista/realizador/produtor/actor.
O escriba de vários filmes de série B trabalhou com o mestre Roger Corman em clássicos como The Little Shop Of Horrors original e Bucket Of Blood e ainda um dos co-autores de Death Race 2000. Há mais de uma década que não apresentava novos trabalhos mas o mundo da cinefilia está de luto em honra deste argumentista/realizador/produtor/actor.
Planes, Trains And Automobiles
de John Hughes
É sempre uma tarefa quase ingrata analisar os filmes de Hughes. Ele que é conhecido por estar, no site do imdb, na lista dos melhores e dos piores filmes edificou-se como o mais importante realizador dos anos 80. Não em termos técnicos nem muito menos por ser um pioneiro mas as suas obras dessa década foram marcos para uma juventude que agora goza a idade adulta, ainda hoje até Matt Groening aponta referências atrás de referências ao seu amor por Breakfast Club e se em Portugal o realizador é esquecido para filmes da tarde da TVI nunca é demais relembrar que houve uma altura em que os adolescentes eram protagonistas sérios, o Steve Martin tinha piada e o John Candy era o tio que todos queríamos ter.
Planes, Trains And Automobiles não é a sua melhor obra. Será até daquelas que se podem considerar prazeres escondidos dentro da sua obra. Admito que não seja a área que Hughes controlasse melhor (ele domina a vida no liceu melhor que os "buddy movies") e que a promessa de Martin com Candy faça parecer que temos uma comédia de génio nas mãos mesmo quando no fim temos pura e simplesmente um "road movie" simples sem pretensões. É essa a palavra-chave da melhor cinematografia Hughesiana - falta de pretensões e apenas manter o espírito de uma história simples sem tentar exagerar nos mecanismos.
Passando uns dias antes do dia de Acção de Graças, o filme segue Neal Page (Steven Martin) enquanto tenta chegar a tempo para jantar com a família no feriado norte-americano. Mas uma série de azares atrasam constantemente os planos de Page que é obrigado a aceitar a ajuda do bem intencionado Del Griffith (John Candy), antípoda de Page mas com bom coração, claro. Premissa aceitável para uma série de acontecimentos ridículos com soluções delirantes. Sim, é o mesmo esquema de sempre mas com o bónus de estar um adorado ao leme, John Hughes é tão eficaz que não se pode ficar ofendido nem aborrecido com os seus filmes mas acima de tudo é a altura em que o filme foi feito. Ver este Planes, Trains and Automobiles é como pegar naqueles filmes que viamos quando tínhamos 7 anos só que ao contrário de Karate Kid, por exemplo, o filme não perde nenhum do seu encanto nem aparente vestígios de fraca qualidade.
É SÓ uma pequena obra eficaz à qual não se pode apontar nada de concreto e que ainda nos consegue dar algo de mais satisfatório que uma sensação de nostalgia.
(vou tentar fazer mais cinco posts até terça-feira para compensar o tempo perdido. O lado obscuro é não poder voltar a escrever os testamentos que antes fazia mas aí até deixo de gastar tanto o vosso tempo)
É sempre uma tarefa quase ingrata analisar os filmes de Hughes. Ele que é conhecido por estar, no site do imdb, na lista dos melhores e dos piores filmes edificou-se como o mais importante realizador dos anos 80. Não em termos técnicos nem muito menos por ser um pioneiro mas as suas obras dessa década foram marcos para uma juventude que agora goza a idade adulta, ainda hoje até Matt Groening aponta referências atrás de referências ao seu amor por Breakfast Club e se em Portugal o realizador é esquecido para filmes da tarde da TVI nunca é demais relembrar que houve uma altura em que os adolescentes eram protagonistas sérios, o Steve Martin tinha piada e o John Candy era o tio que todos queríamos ter.
Planes, Trains And Automobiles não é a sua melhor obra. Será até daquelas que se podem considerar prazeres escondidos dentro da sua obra. Admito que não seja a área que Hughes controlasse melhor (ele domina a vida no liceu melhor que os "buddy movies") e que a promessa de Martin com Candy faça parecer que temos uma comédia de génio nas mãos mesmo quando no fim temos pura e simplesmente um "road movie" simples sem pretensões. É essa a palavra-chave da melhor cinematografia Hughesiana - falta de pretensões e apenas manter o espírito de uma história simples sem tentar exagerar nos mecanismos.
Passando uns dias antes do dia de Acção de Graças, o filme segue Neal Page (Steven Martin) enquanto tenta chegar a tempo para jantar com a família no feriado norte-americano. Mas uma série de azares atrasam constantemente os planos de Page que é obrigado a aceitar a ajuda do bem intencionado Del Griffith (John Candy), antípoda de Page mas com bom coração, claro. Premissa aceitável para uma série de acontecimentos ridículos com soluções delirantes. Sim, é o mesmo esquema de sempre mas com o bónus de estar um adorado ao leme, John Hughes é tão eficaz que não se pode ficar ofendido nem aborrecido com os seus filmes mas acima de tudo é a altura em que o filme foi feito. Ver este Planes, Trains and Automobiles é como pegar naqueles filmes que viamos quando tínhamos 7 anos só que ao contrário de Karate Kid, por exemplo, o filme não perde nenhum do seu encanto nem aparente vestígios de fraca qualidade.
É SÓ uma pequena obra eficaz à qual não se pode apontar nada de concreto e que ainda nos consegue dar algo de mais satisfatório que uma sensação de nostalgia.
(vou tentar fazer mais cinco posts até terça-feira para compensar o tempo perdido. O lado obscuro é não poder voltar a escrever os testamentos que antes fazia mas aí até deixo de gastar tanto o vosso tempo)
Friday, 28 September 2007
The Prestige (2006)
de Christopher Nolan
Sempre me admirei com o trabalho de Christopher Nolan. Um trabalho consistente até agora e capaz de destruir as convenções do cinema norte-americano só podia vir de um estudante britânico com vontade de experimentar com a relação entre o público e a narrativa. Os seus filmes não são particularmente complexos, muito pelo contrário, mas ele sabe assegurar um nível mínimo de inteligência na estética da narrativa como se a própria obra dependesse (e depende) desse factor. E diverte-se, diverte-se mais do muitos outros realizadores.
Mas Nolan pode falhar. Todos os elogios que lhe deram desde Memento nunca poderiam conter a noção realizador único e futuro mestre do cinema, apenas alguém que prometia uma nova experiência ao espectador e conseguia exactamente isso. Criou uma adaptação de banda-desenhada com os pés mais acentes na terra (principal vantagem de Batman Begins) e fez um remake dentro da verdadeira etimologia da palavra (Insomnia adaptou à boa maneira de John Sturges o original norueguês em vez de o copiar passo-a-passo ou o ofender) mas nada dessas virtudes é capaz de pôr Nolan no panteão, muito menos no pedestal dos realizadores mais importantes do cinema norte-americano moderno. Atenção, ele é um óptimo realizador, eficaz acima de tudo, mas nada de ultra-original ou profundo que fique para a posteridade na lista dos clássicos intocáveis. Só que sabe bem ver os seus filmes e construir os puzzles, que é isso exactamente o que eles são, peças desconexas que têm que ser completadas pelo espectador para seu próprio prazer.
A diferença entre os seus filmes anteriores e este seu último é que pelo menos antes Nolan tratava tudo com precisão científica, até a suspensão de descrédito que o público é obrigar a ter e nunca enganava ninguém. Portanto que se passou com esta nova história? Primeiro está o livro em que The Prestige se baseou, portanto é necessário ser fiél à história, certo? Muitas vezes não, muita vez um filme não aguenta passos, personagens, tratamentos e resoluções que leva a que o núcleo da obra original tenha que ser simplificado e a partir daí construído passo-a-passo para complementar a estética original que o realizador planeou. Neste caso, dois mágicos rivais continuam uma eterna rotina de vingança entre um e outro que chega ao auge quando um deles cria um truque perfeito que parece contrariar verdadeiras leis da física. Ponto, o ponto-de-partida delineado devia ter servido para os dois irmãos Nolan escreverem o argumento e a partir daí puderem retirar todos os elementos que nunca funcionariam num filme de duas horas. Neste caso, o final. Depois de centena e meia de minutos de especulação e ansiedade pela resposta final, exige-se uma conclusão fiável e dentro do estilo que o filme todo andava a ter, mas o que Nolan nos dá é a resolução mais ridícula que se podia encontrar, uma parafernália de elementos inacreditáveis que não parecem fazer parte deste filme mas de uma obra de Stephen King.
É uma pena ter acabado com um sentimento e raiva, pena porque os dois primeiros actos são belíssimos e muito bem construído. Durante mais de metade do filme temos Christian Bale na prisão a ler o diário de Hugh Jackman a ler o diário de Christian Bale, portanto na boa tradição Nolan a acção salta de um lado ao outro, avança e recua, engana e revela obrigando-nos ao exercício mental de tentar situar todos os eventos naquele espaço de tempo. Ver filmes assim com a nossa mente ocupada dessa forma é extremamente compensatório, ao mesmo tempo que tentamos desmascarar as intenções do realizador sabemos que ele aproveita a distracção para nos surpreender ainda mais. Sim, o público gosta de ser enganado, não que o ofendam ou tomem por estúpido mas que simplesmente o enganem. Nos dois primeiros actos do filme tudo corre assim, sempre bem balançeado, nada de grande virtuosismo cinematográfico nem segundos sentidos - é um filme sobre isto e é isto que se passa. O problema começa na terceira parte quando já ninguém está a ler o diário de ninguém e só falta mesmo atar os nós. Completamente levado pelo seu próprio génio, Nolan pensa que é necessário deixar mais umas pistas de última hora para a resolução final e estica sequência atrás de sequência e repete-se e aos poucos parece que é ele que está atrás da mesa de montagem a pedir por mais em vez de reparar no público atrás de si que troca a impaciência por suspeita e depois por desinteresse. E é quando chegamos a essa fase que Nolan decide apresentar o duelo final com o primeiro mistério a ser despachado e, surpresa, tantas voltas que dá no terceiro acto que já toda a gente descobriu o que era mas nem isso impede que Bale estique a sua explicação por uns bons minutos sem noção nenhuma de pragmatismo cinematográfico, esse pragmatismo que era até então uma das armas mais poderosas da anterior cinematografia de Nolan. E então vem a resolução final, aquilo que estávamos à espera desdo primeiro twist (sim, o filme tem vários) é ridícula e cria um buraco gigantesco na finalidade de várias personagens finais. É como se Nolan nos tentasse surpreender com tanta força que tenha vendido as suas intenções ao diabo e acabado por se enganar a si próprio.
The Prestige é um filme que não consegue atingir a sua verdadeira finalização por causa de Nolan só. Os actores parecem acreditar no que estão a ver, Caine, Bale e Bowie são fortes nas suas interpretações ao contrário de Jackman e Johansson que vagueiam completamente sem rumo como se estivessem já a antever uma faca nas costas que Christopher, esse realizador a quem eu ainda ponho muitas das minhas esperanças, quis dar a todos os que virem o seu filme.
Sempre me admirei com o trabalho de Christopher Nolan. Um trabalho consistente até agora e capaz de destruir as convenções do cinema norte-americano só podia vir de um estudante britânico com vontade de experimentar com a relação entre o público e a narrativa. Os seus filmes não são particularmente complexos, muito pelo contrário, mas ele sabe assegurar um nível mínimo de inteligência na estética da narrativa como se a própria obra dependesse (e depende) desse factor. E diverte-se, diverte-se mais do muitos outros realizadores.
Mas Nolan pode falhar. Todos os elogios que lhe deram desde Memento nunca poderiam conter a noção realizador único e futuro mestre do cinema, apenas alguém que prometia uma nova experiência ao espectador e conseguia exactamente isso. Criou uma adaptação de banda-desenhada com os pés mais acentes na terra (principal vantagem de Batman Begins) e fez um remake dentro da verdadeira etimologia da palavra (Insomnia adaptou à boa maneira de John Sturges o original norueguês em vez de o copiar passo-a-passo ou o ofender) mas nada dessas virtudes é capaz de pôr Nolan no panteão, muito menos no pedestal dos realizadores mais importantes do cinema norte-americano moderno. Atenção, ele é um óptimo realizador, eficaz acima de tudo, mas nada de ultra-original ou profundo que fique para a posteridade na lista dos clássicos intocáveis. Só que sabe bem ver os seus filmes e construir os puzzles, que é isso exactamente o que eles são, peças desconexas que têm que ser completadas pelo espectador para seu próprio prazer.
A diferença entre os seus filmes anteriores e este seu último é que pelo menos antes Nolan tratava tudo com precisão científica, até a suspensão de descrédito que o público é obrigar a ter e nunca enganava ninguém. Portanto que se passou com esta nova história? Primeiro está o livro em que The Prestige se baseou, portanto é necessário ser fiél à história, certo? Muitas vezes não, muita vez um filme não aguenta passos, personagens, tratamentos e resoluções que leva a que o núcleo da obra original tenha que ser simplificado e a partir daí construído passo-a-passo para complementar a estética original que o realizador planeou. Neste caso, dois mágicos rivais continuam uma eterna rotina de vingança entre um e outro que chega ao auge quando um deles cria um truque perfeito que parece contrariar verdadeiras leis da física. Ponto, o ponto-de-partida delineado devia ter servido para os dois irmãos Nolan escreverem o argumento e a partir daí puderem retirar todos os elementos que nunca funcionariam num filme de duas horas. Neste caso, o final. Depois de centena e meia de minutos de especulação e ansiedade pela resposta final, exige-se uma conclusão fiável e dentro do estilo que o filme todo andava a ter, mas o que Nolan nos dá é a resolução mais ridícula que se podia encontrar, uma parafernália de elementos inacreditáveis que não parecem fazer parte deste filme mas de uma obra de Stephen King.
É uma pena ter acabado com um sentimento e raiva, pena porque os dois primeiros actos são belíssimos e muito bem construído. Durante mais de metade do filme temos Christian Bale na prisão a ler o diário de Hugh Jackman a ler o diário de Christian Bale, portanto na boa tradição Nolan a acção salta de um lado ao outro, avança e recua, engana e revela obrigando-nos ao exercício mental de tentar situar todos os eventos naquele espaço de tempo. Ver filmes assim com a nossa mente ocupada dessa forma é extremamente compensatório, ao mesmo tempo que tentamos desmascarar as intenções do realizador sabemos que ele aproveita a distracção para nos surpreender ainda mais. Sim, o público gosta de ser enganado, não que o ofendam ou tomem por estúpido mas que simplesmente o enganem. Nos dois primeiros actos do filme tudo corre assim, sempre bem balançeado, nada de grande virtuosismo cinematográfico nem segundos sentidos - é um filme sobre isto e é isto que se passa. O problema começa na terceira parte quando já ninguém está a ler o diário de ninguém e só falta mesmo atar os nós. Completamente levado pelo seu próprio génio, Nolan pensa que é necessário deixar mais umas pistas de última hora para a resolução final e estica sequência atrás de sequência e repete-se e aos poucos parece que é ele que está atrás da mesa de montagem a pedir por mais em vez de reparar no público atrás de si que troca a impaciência por suspeita e depois por desinteresse. E é quando chegamos a essa fase que Nolan decide apresentar o duelo final com o primeiro mistério a ser despachado e, surpresa, tantas voltas que dá no terceiro acto que já toda a gente descobriu o que era mas nem isso impede que Bale estique a sua explicação por uns bons minutos sem noção nenhuma de pragmatismo cinematográfico, esse pragmatismo que era até então uma das armas mais poderosas da anterior cinematografia de Nolan. E então vem a resolução final, aquilo que estávamos à espera desdo primeiro twist (sim, o filme tem vários) é ridícula e cria um buraco gigantesco na finalidade de várias personagens finais. É como se Nolan nos tentasse surpreender com tanta força que tenha vendido as suas intenções ao diabo e acabado por se enganar a si próprio.
The Prestige é um filme que não consegue atingir a sua verdadeira finalização por causa de Nolan só. Os actores parecem acreditar no que estão a ver, Caine, Bale e Bowie são fortes nas suas interpretações ao contrário de Jackman e Johansson que vagueiam completamente sem rumo como se estivessem já a antever uma faca nas costas que Christopher, esse realizador a quem eu ainda ponho muitas das minhas esperanças, quis dar a todos os que virem o seu filme.
Sunday, 23 September 2007
Clerks II
de Kevin Smith
Não sou o maior fã do Kevin Smith. Não é um bom realizador, os diálogos podem ser bons (e são) mas os argumentos na sua maioria têm uma estrutura péssima e facilmente cai no facilitismo e no "eu e os meus amigos a fazer um filme". Mas tenho o maior dos afectos pela sua primeira obra, Clerks (1994), não só pelo esforço inumano de Smith e Mosier para terminar aquela produção de 23.000 dólares como também admito ter respeito por filmes que são feitos com uma paixão superior só pelo simples facto do seu autor estar a mexer em material e com personagens que ele tão bem conhece. Por isso é que acho que Dogma e Jay and Silent Bob Strikes Back são tiros ao lado e Mallrats e, principalmente, Chasing Amy dois belos filmes que merecem todo o respeito da contra-cultura que representam e não merecem o ignorar da elite cinéfila que pouco quer saber do Askewverse onde todos os filmes de Smith se passam. É verdade que ele tem esse grande problema de parecer estar a divertir-se demais e ter profissionalismo a menos, juntar os seus amigos constantemente é muito giro mas pode sair o tiro pela culatra (a mulher de Smith é um pedaço de respeito, sim senhor, mas actriz é que não parece ser) e evita que ele se desenvolva como realizador, impede que aprenda a técnica deixando que os seus filmes pareçam saídos de um episódio especial de uma série de televisão, a montagem seja prosaica e a sua escolha de músicas para pontuar certas cenas ou desnecessária ou péssima.
Como disse guardo um especial carinho por Clerks. Não é preciso uma pessoa ter trabalhado numa loja de conveniência para se relacionar tanto com as personagens, justo dizer que tive muitas dessas conversas a tentar trabalhar para trabalhos de escola ou quando era suposto estar a estudar mas decidia sentar-me num qualquer sítio com uns quaisquer amigos a discutir mulheres, Star Wars e gente estúpida que tínhamos que encontrar. E esse filme era tudo para mim, ainda sou um daqueles que se ri quando vê o número 37 ou afirma best of both words quando a conversa descai para o hermafroditismo. Daí que sair agradecido desta sequela 12 anos depois fosse para mim tanto improvável como desejável. Tinha que ter um sentido, Dante e Randall tinham que atingir algum objectivo ou servir de ponto de viragem para as suas vidas mas ao mesmo tempo queria mais do mesmo, queria que eles pouco ou nada tivessem mudado nesta década passada e só sofressem de uma exclusão dentro do grupo etário porque toda a gente da época deles já avanço enquanto estes dois continuam resignados no mesmo sítio.
E não podia estar mais certo. Felizmente toda as minhas esperanças foram cumpridas e rapidamente pude juntar Clerks II não só à lista dos melhores filmes de Smith como provavelmente no topo da mesma. Foi difícil no início habituar-me ao mundo de Smith onde os actores tanto podem ser bons como muito maus e os diálogos tendem a repetir a mesma estrutura deixando, outra vez, a progressão dramática completamente estagnada. Mas a partir do momento em que Randall desbarata sobre a conotação racista ou não da expressão porch monkey que não precisei de mais, o espírito do original estava aqui com uma adição superior - Smith progrediu, não muito, continua a ser um fraco realizador, mas era como ver Clerks filmados por alguém com um mínimo de sabedoria técnica e estrutural. Mas de repente chegamos a meio do filme e Smith dá-nos um bombom que nunca pensei que fosse capaz, uma fabulosa sequência musical ao som dos Jacksons 5 arranca-nos da suspensão de descrédito mas liga toda a gente naquele espaço de tempo como se cena acabasse por ter mais importância no futuro e, surpresa, tem!
A história. Dante e Randall já não trabalham na mesma loja de conveniência que foi completamente destruída num incêndio. Em vez disso os dois mudam-se para um restaurante de uma cadeia de fast-food chamada Mooby's onde têm que passar os dias a fazer hambúrgueres e fritar batatas-fritas. Como no anterior a acção toda passa-se num único dia, o último de Dante antes de ir para a Flórida com a sua noiva onde se vai casar, viver e trabalhar num sítio "a sério". O restaurante esse é gerido pela bela Becky (Rosario Dawson) que vê em Dante muito mais por um grande amigo, e ainda há Elias, o novo geek viciado em Transformers e Senhor dos Anéis, bem comportado e bom cristão logo principal alvo para as blasfémias de Randall. E, claro, Jay e Silent Bob que sem loja de conveniência para poderem estar encostados à parede o dia inteiro a vender droga e não fazer nada mudam-se para o restaurante para continuar o mesmo de sempre.
Pouco ou nada mudou. Randall continua as mal-tratar os seus clientes e Dante continua dividido entre duas mulheres e a reclamar que está farto daquela vida de adolescente, que tem que voltar à sociedade. Mas mais importante que isso é a noção que Smith começa a estar desajustado com os seus sucessores no mundo geek. Já não se fala de trilogias do Lucas mas sim do Peter Jackson, já não se tem a liberdade adolescente dos belos tempos da América grunge mas agora são todos protegidos deste mundo devasso e ímpio. Smith trata os seus com respeito, certo que vomita as suas teorias e opiniões com a mesma raiva de sempre mas também aceita até certo ponto os novos tempos e tendências. A escolha de músicas prova que o próprio realizador/argumentista pouco sabe do que se passa no mundo agora, de Smashing Pumpkins a Soul Asylum só parece que aquele que antes era a voz de uma série de misfits americanos parou naquele tempo da sua contra-cultura. É triste mas só torna o filme ainda mais interessante. Se o primeiro era sobre Smith a trabalhar na loja (a mesma onde o filme foi filmado) e a falar com os seus amigos sobre tudo e nada, o segundo é sobre Smith admitir que foi ultrapassado pelos tempos.
Certas cenas são belíssimos primores. O já mencionado diálogo sobre racismo, a luta entre fãs da Guerra das Estrelas e fãs do Senhore dos Anéis e a também mencionada sequência musical. Mas aquela que fica mais na memória é perto do final do segundo acto quando Kevin parece mostrar mais coragem que aquela que tinha quando fez o primeiro. Num volte-face incrível o filme dá-nos um espectáculo de bestialismo (desculpem, erotica entre-espécies) quando todas as personagens se juntam num caos emocional avassalador. Ainda melhor é a força da sequência, de repente a tensão dramática é posta em segundo plano para que a mula e o seu dono possam fazer o seu trabalho.
Kevin Smith nunca será um excelente realizador nem um génio que os seus fãs tanto querem proclamar. Nunca será, aliás, mais do que um excelente escritor de diálogos com um grupo de amigos fabuloso e a maior sorte deste mundo. Mas que salta de alguns dos seus filmes é tão grande que não se pode ignorar, apesar de tudo ele gosta do que faz e o que faz é mais que aceitável, é agradável e nalguns casos, neste principalmente, magnífico! Imagino muitas das pessoas que o idolatram a acabar de ver Clerks II e largarem um simples obrigado por voltar a dar-nos uma fotocópia daquilo que sempre pensámos mas nunca tivemos coragem de dizer. Justiça seja-lhe feita, esta sequela começa e termina exactamente como qualquer fã do original sempre quis e isso só se deve ao olho clínico de Smith e pouco mais. Entristece-me saber que não voltarei a ver Randall e Dante de volta, mas por outro lado o final foi mais que conclusivo, está na hora de todos nós seguirmos também com as nossas vidas.
(última achega para o título português: "Nunca tantos fizeram tão pouco". Que escolha é esta? Que total indignação pelo primeiro filme que nem um título cativante foram capazes de dar, quanto mais relembrar que estamos na presença de uma sequela como não só o 2 do título original o diz como os créditos iniciais tão bem o fazem transparecer)
Não sou o maior fã do Kevin Smith. Não é um bom realizador, os diálogos podem ser bons (e são) mas os argumentos na sua maioria têm uma estrutura péssima e facilmente cai no facilitismo e no "eu e os meus amigos a fazer um filme". Mas tenho o maior dos afectos pela sua primeira obra, Clerks (1994), não só pelo esforço inumano de Smith e Mosier para terminar aquela produção de 23.000 dólares como também admito ter respeito por filmes que são feitos com uma paixão superior só pelo simples facto do seu autor estar a mexer em material e com personagens que ele tão bem conhece. Por isso é que acho que Dogma e Jay and Silent Bob Strikes Back são tiros ao lado e Mallrats e, principalmente, Chasing Amy dois belos filmes que merecem todo o respeito da contra-cultura que representam e não merecem o ignorar da elite cinéfila que pouco quer saber do Askewverse onde todos os filmes de Smith se passam. É verdade que ele tem esse grande problema de parecer estar a divertir-se demais e ter profissionalismo a menos, juntar os seus amigos constantemente é muito giro mas pode sair o tiro pela culatra (a mulher de Smith é um pedaço de respeito, sim senhor, mas actriz é que não parece ser) e evita que ele se desenvolva como realizador, impede que aprenda a técnica deixando que os seus filmes pareçam saídos de um episódio especial de uma série de televisão, a montagem seja prosaica e a sua escolha de músicas para pontuar certas cenas ou desnecessária ou péssima.
Como disse guardo um especial carinho por Clerks. Não é preciso uma pessoa ter trabalhado numa loja de conveniência para se relacionar tanto com as personagens, justo dizer que tive muitas dessas conversas a tentar trabalhar para trabalhos de escola ou quando era suposto estar a estudar mas decidia sentar-me num qualquer sítio com uns quaisquer amigos a discutir mulheres, Star Wars e gente estúpida que tínhamos que encontrar. E esse filme era tudo para mim, ainda sou um daqueles que se ri quando vê o número 37 ou afirma best of both words quando a conversa descai para o hermafroditismo. Daí que sair agradecido desta sequela 12 anos depois fosse para mim tanto improvável como desejável. Tinha que ter um sentido, Dante e Randall tinham que atingir algum objectivo ou servir de ponto de viragem para as suas vidas mas ao mesmo tempo queria mais do mesmo, queria que eles pouco ou nada tivessem mudado nesta década passada e só sofressem de uma exclusão dentro do grupo etário porque toda a gente da época deles já avanço enquanto estes dois continuam resignados no mesmo sítio.
E não podia estar mais certo. Felizmente toda as minhas esperanças foram cumpridas e rapidamente pude juntar Clerks II não só à lista dos melhores filmes de Smith como provavelmente no topo da mesma. Foi difícil no início habituar-me ao mundo de Smith onde os actores tanto podem ser bons como muito maus e os diálogos tendem a repetir a mesma estrutura deixando, outra vez, a progressão dramática completamente estagnada. Mas a partir do momento em que Randall desbarata sobre a conotação racista ou não da expressão porch monkey que não precisei de mais, o espírito do original estava aqui com uma adição superior - Smith progrediu, não muito, continua a ser um fraco realizador, mas era como ver Clerks filmados por alguém com um mínimo de sabedoria técnica e estrutural. Mas de repente chegamos a meio do filme e Smith dá-nos um bombom que nunca pensei que fosse capaz, uma fabulosa sequência musical ao som dos Jacksons 5 arranca-nos da suspensão de descrédito mas liga toda a gente naquele espaço de tempo como se cena acabasse por ter mais importância no futuro e, surpresa, tem!
A história. Dante e Randall já não trabalham na mesma loja de conveniência que foi completamente destruída num incêndio. Em vez disso os dois mudam-se para um restaurante de uma cadeia de fast-food chamada Mooby's onde têm que passar os dias a fazer hambúrgueres e fritar batatas-fritas. Como no anterior a acção toda passa-se num único dia, o último de Dante antes de ir para a Flórida com a sua noiva onde se vai casar, viver e trabalhar num sítio "a sério". O restaurante esse é gerido pela bela Becky (Rosario Dawson) que vê em Dante muito mais por um grande amigo, e ainda há Elias, o novo geek viciado em Transformers e Senhor dos Anéis, bem comportado e bom cristão logo principal alvo para as blasfémias de Randall. E, claro, Jay e Silent Bob que sem loja de conveniência para poderem estar encostados à parede o dia inteiro a vender droga e não fazer nada mudam-se para o restaurante para continuar o mesmo de sempre.
Pouco ou nada mudou. Randall continua as mal-tratar os seus clientes e Dante continua dividido entre duas mulheres e a reclamar que está farto daquela vida de adolescente, que tem que voltar à sociedade. Mas mais importante que isso é a noção que Smith começa a estar desajustado com os seus sucessores no mundo geek. Já não se fala de trilogias do Lucas mas sim do Peter Jackson, já não se tem a liberdade adolescente dos belos tempos da América grunge mas agora são todos protegidos deste mundo devasso e ímpio. Smith trata os seus com respeito, certo que vomita as suas teorias e opiniões com a mesma raiva de sempre mas também aceita até certo ponto os novos tempos e tendências. A escolha de músicas prova que o próprio realizador/argumentista pouco sabe do que se passa no mundo agora, de Smashing Pumpkins a Soul Asylum só parece que aquele que antes era a voz de uma série de misfits americanos parou naquele tempo da sua contra-cultura. É triste mas só torna o filme ainda mais interessante. Se o primeiro era sobre Smith a trabalhar na loja (a mesma onde o filme foi filmado) e a falar com os seus amigos sobre tudo e nada, o segundo é sobre Smith admitir que foi ultrapassado pelos tempos.
Certas cenas são belíssimos primores. O já mencionado diálogo sobre racismo, a luta entre fãs da Guerra das Estrelas e fãs do Senhore dos Anéis e a também mencionada sequência musical. Mas aquela que fica mais na memória é perto do final do segundo acto quando Kevin parece mostrar mais coragem que aquela que tinha quando fez o primeiro. Num volte-face incrível o filme dá-nos um espectáculo de bestialismo (desculpem, erotica entre-espécies) quando todas as personagens se juntam num caos emocional avassalador. Ainda melhor é a força da sequência, de repente a tensão dramática é posta em segundo plano para que a mula e o seu dono possam fazer o seu trabalho.
Kevin Smith nunca será um excelente realizador nem um génio que os seus fãs tanto querem proclamar. Nunca será, aliás, mais do que um excelente escritor de diálogos com um grupo de amigos fabuloso e a maior sorte deste mundo. Mas que salta de alguns dos seus filmes é tão grande que não se pode ignorar, apesar de tudo ele gosta do que faz e o que faz é mais que aceitável, é agradável e nalguns casos, neste principalmente, magnífico! Imagino muitas das pessoas que o idolatram a acabar de ver Clerks II e largarem um simples obrigado por voltar a dar-nos uma fotocópia daquilo que sempre pensámos mas nunca tivemos coragem de dizer. Justiça seja-lhe feita, esta sequela começa e termina exactamente como qualquer fã do original sempre quis e isso só se deve ao olho clínico de Smith e pouco mais. Entristece-me saber que não voltarei a ver Randall e Dante de volta, mas por outro lado o final foi mais que conclusivo, está na hora de todos nós seguirmos também com as nossas vidas.
(última achega para o título português: "Nunca tantos fizeram tão pouco". Que escolha é esta? Que total indignação pelo primeiro filme que nem um título cativante foram capazes de dar, quanto mais relembrar que estamos na presença de uma sequela como não só o 2 do título original o diz como os créditos iniciais tão bem o fazem transparecer)
The Last King Of Scotland (2006)
de Kevin Macdonald
Começo a ter uma predilecção pelos dramas/thrillers passados em África que começam a sair do cinema americano. Hotel Rwanda já tinha sido para mim uma surpresa enorme, onde esperava um filme para Don Cheadle ganhar reconhecimento acabei por ver uma história crua como aquelas se devia contar sobre este continente antes de o romantizar como Sydney Pollack. Depois veio The Constant Gardner, de Fonseca Meirelles, que já esperava ser bom e não fiquei desiludido. Todos estes filmes unem-se numa única particularidade, a afirmação do indecente abuso que o continente é submetido por parte dos países desenvolvidos, nada que não fosse já senso-comum mas o pensamento colectivo é uma coisa e a intervenção artística é outra, a segunda mais eficaz e primeiro passo para quem de facto tem poder para mudar as políticas para com África possa começar a acção. Claro que não é assim tão evidente mas o facto de começarmos a ter um ressurgimento de filmes com esta temática parece mostrar uma impaciência para com as poucas medidas tomadas. E sim, é entretenimento mas é alguma coisa.
Tenho a consciência do pouco poder que a intervenção artística tem, um filme tem o poder de nos fazer pensar durante os minutos seguintes antes que voltemos a reagir como se nada passasse. Mas pelo menos imprimiu-se para a posteridade um relato contestatário de uma qualquer injustiça ou erros passados constantemente repetidos, sejam as experiências das farmacêuticas em África, apoio a ditadores cruéis, relatos de tortura por parte de países industrializados e todos outros crimes contra a humanidade cometidos. É importante que o público se sente no cinema com um balde de pipocas e testemunhe, é bem melhor que ser estupidificado por comédias por comédias entorpecidas ou acção parca em inteligência.
The Last King Of Scotland foi um dos títulos proclamados pelo ditador ugandês Idi Amin Dada (Forest Whitaker) nos anos 70. Uma personagem rebelde que tomou conta do país num golpe de estado e aos poucos caía numa espiral de paranóia e violência insensível. A sua imagem eram completamente denegrida pelos media europeus e americanos, chamavam-lhe de canibal e palhaço mas pareciam todos virar aos olhos às atrocidades de Amin. O relato do filme é fictício até certo ponto, a história do jovem médico escocês que se torna conselheiro pessoal de Idi Amin não é verdadeira mas relaciona-se com as relações internacionais entre a Inglaterra e o governo do ditador ugandês da mesma forma que o hotel de Cheadle em Hotel Rwanda simbolizava a mão belga na ex-colónia. Visto do ponto de vista do jovem Nicholas Garrigan (James McAvoy) a relação com o chefe de estado vai-se deturpando, se no início ele confia no governo e mostra-se interessado no progresso do país mais tarde enquanto casos verídicos se vão revelando e as atrocidades chegam aos seus olhos ele tenta fugir e largar o país naquelas mãos sangrentas. É extremamente in your face, sim, mas o objectivo do filme é exactamente esse. Aliás, não é de admirar que o governo e o povo ugandês tenha apoiado tanto esta produção admitindo ser importante que um olho de fora venha analisar o que aconteceu ao pequeno país do centro de África.
Mas o filme consegue ser mais cru e brutal do que seria de esperar. Não se fica pelo choque das intervenções estrangeiras como em Constant Gardner ou pela luta da sobrevivência do filme de Cheadle. Kevin Macdonald quer dar um passo ainda mais chocante, ele que já tinha feito o belíssimo "pseudo-documentário" Touching The Void não abre a mão e atira todo o grafismo brutal para fazer jus à exploração de Idi Amin. O filme é constantemente pontuado por cenas de violência gráfica puríssimas, quer seja a mutilação de uma das personagens ou a tortura final de Nicholas numa sequência nada normal para um filme desta estatura.
Dos actores já se disse quase tudo. Forest Whitaker vence o seu Óscar mais que merecido mas dou os meus parabéns a Macdonald pela fabulosa escolha do casting. Mais conhecido pelo seu olhar triste e melancólico, imagino que Whitaker não fosse a primeira escolha para este projecto já que ele é normalmente conotado com o vilão redimido que prima pelos seus sentimentos (Ghost Dog, Panic Room). Mas aqui os seus olhos conseguem ser mais incisivos que nunca e se a actuação dele de método não fosse já suficiente as características físicas não entram na caricatura mas no medo e instabilidade que Idi Amin provocava em toda a gente.
Depois deste espero ver num futuro próximo Blood Diamond pela mesma temática. Afinal há uma necessidade político-social para este tipo de filmes e enquanto o entretenimento não ultrapassar a importante mensagem está-se num bom caminho para um novo género de filmes de intervenção política global.
Começo a ter uma predilecção pelos dramas/thrillers passados em África que começam a sair do cinema americano. Hotel Rwanda já tinha sido para mim uma surpresa enorme, onde esperava um filme para Don Cheadle ganhar reconhecimento acabei por ver uma história crua como aquelas se devia contar sobre este continente antes de o romantizar como Sydney Pollack. Depois veio The Constant Gardner, de Fonseca Meirelles, que já esperava ser bom e não fiquei desiludido. Todos estes filmes unem-se numa única particularidade, a afirmação do indecente abuso que o continente é submetido por parte dos países desenvolvidos, nada que não fosse já senso-comum mas o pensamento colectivo é uma coisa e a intervenção artística é outra, a segunda mais eficaz e primeiro passo para quem de facto tem poder para mudar as políticas para com África possa começar a acção. Claro que não é assim tão evidente mas o facto de começarmos a ter um ressurgimento de filmes com esta temática parece mostrar uma impaciência para com as poucas medidas tomadas. E sim, é entretenimento mas é alguma coisa.
Tenho a consciência do pouco poder que a intervenção artística tem, um filme tem o poder de nos fazer pensar durante os minutos seguintes antes que voltemos a reagir como se nada passasse. Mas pelo menos imprimiu-se para a posteridade um relato contestatário de uma qualquer injustiça ou erros passados constantemente repetidos, sejam as experiências das farmacêuticas em África, apoio a ditadores cruéis, relatos de tortura por parte de países industrializados e todos outros crimes contra a humanidade cometidos. É importante que o público se sente no cinema com um balde de pipocas e testemunhe, é bem melhor que ser estupidificado por comédias por comédias entorpecidas ou acção parca em inteligência.
The Last King Of Scotland foi um dos títulos proclamados pelo ditador ugandês Idi Amin Dada (Forest Whitaker) nos anos 70. Uma personagem rebelde que tomou conta do país num golpe de estado e aos poucos caía numa espiral de paranóia e violência insensível. A sua imagem eram completamente denegrida pelos media europeus e americanos, chamavam-lhe de canibal e palhaço mas pareciam todos virar aos olhos às atrocidades de Amin. O relato do filme é fictício até certo ponto, a história do jovem médico escocês que se torna conselheiro pessoal de Idi Amin não é verdadeira mas relaciona-se com as relações internacionais entre a Inglaterra e o governo do ditador ugandês da mesma forma que o hotel de Cheadle em Hotel Rwanda simbolizava a mão belga na ex-colónia. Visto do ponto de vista do jovem Nicholas Garrigan (James McAvoy) a relação com o chefe de estado vai-se deturpando, se no início ele confia no governo e mostra-se interessado no progresso do país mais tarde enquanto casos verídicos se vão revelando e as atrocidades chegam aos seus olhos ele tenta fugir e largar o país naquelas mãos sangrentas. É extremamente in your face, sim, mas o objectivo do filme é exactamente esse. Aliás, não é de admirar que o governo e o povo ugandês tenha apoiado tanto esta produção admitindo ser importante que um olho de fora venha analisar o que aconteceu ao pequeno país do centro de África.
Mas o filme consegue ser mais cru e brutal do que seria de esperar. Não se fica pelo choque das intervenções estrangeiras como em Constant Gardner ou pela luta da sobrevivência do filme de Cheadle. Kevin Macdonald quer dar um passo ainda mais chocante, ele que já tinha feito o belíssimo "pseudo-documentário" Touching The Void não abre a mão e atira todo o grafismo brutal para fazer jus à exploração de Idi Amin. O filme é constantemente pontuado por cenas de violência gráfica puríssimas, quer seja a mutilação de uma das personagens ou a tortura final de Nicholas numa sequência nada normal para um filme desta estatura.
Dos actores já se disse quase tudo. Forest Whitaker vence o seu Óscar mais que merecido mas dou os meus parabéns a Macdonald pela fabulosa escolha do casting. Mais conhecido pelo seu olhar triste e melancólico, imagino que Whitaker não fosse a primeira escolha para este projecto já que ele é normalmente conotado com o vilão redimido que prima pelos seus sentimentos (Ghost Dog, Panic Room). Mas aqui os seus olhos conseguem ser mais incisivos que nunca e se a actuação dele de método não fosse já suficiente as características físicas não entram na caricatura mas no medo e instabilidade que Idi Amin provocava em toda a gente.
Depois deste espero ver num futuro próximo Blood Diamond pela mesma temática. Afinal há uma necessidade político-social para este tipo de filmes e enquanto o entretenimento não ultrapassar a importante mensagem está-se num bom caminho para um novo género de filmes de intervenção política global.
Saturday, 22 September 2007
The Fog (1980)
de John Carpenter
Tenho pena de quem não consegue ainda levar a sério John Carpenter e o reduz à série B e falta de carisma (como se fosse possível). Faz-me lembrar François Truffaut que admitia o amor ao cinema como principal característica de um bom filme, a paixão do seu criador à arte que lhe serve de veículo e abstenção dos lugares comuns da cinefilia de modelo de obras que por muita seriedade que possam ter acaba como ver três episódios seguidos das séries do Seth MacFarlane - um é giro e os seguintes exactamente iguais e aborrecidos.
Mesmo os últimos de Carpenter, excluíndo os fabulosos episódios da série Masters Of Horror, foram muito incompreendidos por novas gerações de cinéfilos que falharam completamente as referências contidas. Lá estão Vampiros e Fantasmas de Marte na lista dos melhores westerns dos anos 90 e do melhor que John Ford já fez desde que morreu.
Mas apesar de toda essa indiferença ninguém tira a Carpenter os seus primeiros filmes e o valor que estes tiveram que serviram para ele ter o direito de usar o seu nome nos seus títulos, poucos o merecem mas Carpenter trabalho para isso. Apesar do culto que corre em filmes como Escape From New York, The Thing e Big Trouble In Little China a incisão cinematográfica do realizador não pode ser escondida. A verdade é que todos os seus filmes requerem uma vasta análise da estética para se chegar à verdadeira intenção, assim como em todos os filmes de todos os grandes realizadores intocáveis.
The Fog é um caso interessantíssimo nesse aspecto. Era o seu quarto filme a estrear nos cinemas e está mesmo no centro daquela fase impressionante entre Assault To Precint 13 e They Live naquilo que foram oito filmes (estou propositadamente a excluir dois cuja qualidade não se compara a estes) em doze anos numa caminhada que só equiparável aos tempos áureos de Alfred Hitchcock. Mas acima de tudo era a edificação de Carpenter como verdadeiro artista da mise-en-scene. Pela primeira vez está Carpenter sozinho, sem referências, sem devoção aos seus mestres mas só ele.
Tudo decorre na pequena cidade costeira de Antonio Bay. Um padre descobre um diário com cem anos que fala de uma tal maldição; uma locutora de rádio local vai dando música e ajudando os barcos que se aproximam da baía e ainda trata do seu filho; um homem dá boleia a uma mulher e os dois apaixonam-se, etc. Todos têm o seu papel mas ninguém toma as rédeas para controlar a catástrofe que cai sobre a cidade - no dia do centenário de Antonio Bay um nevoeiro brilhante dirige-se para a cidade e assassina quem se encontra dentro dele, uma série de mortos-vivos provenientes de uma colónia de leprosos do século passado procura vingança de todos os responsáveis pelo encalhar do seu barco.
Nenhuma das personagens toma o papel do herói interveniente mas todas fazem o melhor para sobreviver a maldição, dito isto o filme é pautado por montagens paralelas atrás de montagens paralelas onde cada interveniente tem uma experiência diferente. A locutora, por exemplo, uma magnífica Adrienne Barbeau, luta contra os mortos-vivos sem nunca saber na realidade o que os trouxe e qual a génese do ataque enquanto o padre, a presidente da câmara e mais uma série de peões se escondem na igreja preparados para o ataque final. Os dois caso entre-ajudam-se constantemente com as sequências a cortarem entre si como se Carpenter tivesse um controlo remoto na mão e nos mostrasse aos poucos, e cada um na sua vez, os destinos diferentes de toda a gente. O melhor é que o não termos tempo suficiente para nos relacionar-mos completamente com todos (no entanto todos têm características personalizadas) faz com que as trocas de Carpenter na montagem criem uma atmosfera verdadeiramente aterradora e eficaz. Pioneirismo no seu melhor e haverá maior paixão pela 7a arte que este respeito pelo público e pelas suas personagens?
Tenho pena de quem não consegue ainda levar a sério John Carpenter e o reduz à série B e falta de carisma (como se fosse possível). Faz-me lembrar François Truffaut que admitia o amor ao cinema como principal característica de um bom filme, a paixão do seu criador à arte que lhe serve de veículo e abstenção dos lugares comuns da cinefilia de modelo de obras que por muita seriedade que possam ter acaba como ver três episódios seguidos das séries do Seth MacFarlane - um é giro e os seguintes exactamente iguais e aborrecidos.
Mesmo os últimos de Carpenter, excluíndo os fabulosos episódios da série Masters Of Horror, foram muito incompreendidos por novas gerações de cinéfilos que falharam completamente as referências contidas. Lá estão Vampiros e Fantasmas de Marte na lista dos melhores westerns dos anos 90 e do melhor que John Ford já fez desde que morreu.
Mas apesar de toda essa indiferença ninguém tira a Carpenter os seus primeiros filmes e o valor que estes tiveram que serviram para ele ter o direito de usar o seu nome nos seus títulos, poucos o merecem mas Carpenter trabalho para isso. Apesar do culto que corre em filmes como Escape From New York, The Thing e Big Trouble In Little China a incisão cinematográfica do realizador não pode ser escondida. A verdade é que todos os seus filmes requerem uma vasta análise da estética para se chegar à verdadeira intenção, assim como em todos os filmes de todos os grandes realizadores intocáveis.
The Fog é um caso interessantíssimo nesse aspecto. Era o seu quarto filme a estrear nos cinemas e está mesmo no centro daquela fase impressionante entre Assault To Precint 13 e They Live naquilo que foram oito filmes (estou propositadamente a excluir dois cuja qualidade não se compara a estes) em doze anos numa caminhada que só equiparável aos tempos áureos de Alfred Hitchcock. Mas acima de tudo era a edificação de Carpenter como verdadeiro artista da mise-en-scene. Pela primeira vez está Carpenter sozinho, sem referências, sem devoção aos seus mestres mas só ele.
Tudo decorre na pequena cidade costeira de Antonio Bay. Um padre descobre um diário com cem anos que fala de uma tal maldição; uma locutora de rádio local vai dando música e ajudando os barcos que se aproximam da baía e ainda trata do seu filho; um homem dá boleia a uma mulher e os dois apaixonam-se, etc. Todos têm o seu papel mas ninguém toma as rédeas para controlar a catástrofe que cai sobre a cidade - no dia do centenário de Antonio Bay um nevoeiro brilhante dirige-se para a cidade e assassina quem se encontra dentro dele, uma série de mortos-vivos provenientes de uma colónia de leprosos do século passado procura vingança de todos os responsáveis pelo encalhar do seu barco.
Nenhuma das personagens toma o papel do herói interveniente mas todas fazem o melhor para sobreviver a maldição, dito isto o filme é pautado por montagens paralelas atrás de montagens paralelas onde cada interveniente tem uma experiência diferente. A locutora, por exemplo, uma magnífica Adrienne Barbeau, luta contra os mortos-vivos sem nunca saber na realidade o que os trouxe e qual a génese do ataque enquanto o padre, a presidente da câmara e mais uma série de peões se escondem na igreja preparados para o ataque final. Os dois caso entre-ajudam-se constantemente com as sequências a cortarem entre si como se Carpenter tivesse um controlo remoto na mão e nos mostrasse aos poucos, e cada um na sua vez, os destinos diferentes de toda a gente. O melhor é que o não termos tempo suficiente para nos relacionar-mos completamente com todos (no entanto todos têm características personalizadas) faz com que as trocas de Carpenter na montagem criem uma atmosfera verdadeiramente aterradora e eficaz. Pioneirismo no seu melhor e haverá maior paixão pela 7a arte que este respeito pelo público e pelas suas personagens?
Friday, 21 September 2007
A Day At The Races
de Sam Wood
Depois do sucesso estrondoso de A Night At The Opera e Duck Soup o filme seguinte dos irmãos Marx é, a meu ver, um gigantesco passo atrás. Nada comparado com o caos e a rapidez dos gags físicos dos anteriores e com um plot que tem tantos eventos que acaba por não seguir para lado nenhum. Não deixa no entanto de ser agradável, algumas sequências são memoráveis e número musical "who's that man" pode pecar por um ligeiro racismo ingénuo mas só lhe dá um encanto datado.
Tudo revira à volta de um hospital de repouso que está prestes a abrir falência mesmo se ao lado está uma pista de cavalos constantemente cheia. Para manter o hospital aberto ainda mais um mês entra uma cinquentenária rica que exige a presença de um certo médico (Groucho) embora ele seja na realidade um veterinário. Na teoria é um típico setting Marxiano mas o plot secundário deixa tudo a perder por nenhum dos irmãos fazer parte dele, o interesse amoroso da directora do hospital começa a criar um cavalo para as corridas e com o dinheiro investir no negócio dela e isto enquanto um grupo de pessoas desejosos de ver a pobre rapariga na bancarrota tentam provar que Groucho está a fingir na sua profissão.
Os próprios irmãos passam a maior parte do tempo sem espírito, Groucho repete gags anteriores e Harpo perde muito da sua imprevisibilidade dos filmes anteriores parecendo por vezes um grupo de fãs a tentar imitá-los e no seu caso, e apenas dois anos antes de A Night At The Opera, acaba por ser quase constragedor.
Não é um mau filme, dentro dos cânones uma má obra dos Marx é sempre das melhores comédias que se podem encontrar, mas depois de sabermos que eles são capazes de desvaires tão insanos como os anteriores acabar por os testemunhar em ponto-morto não sabe tão bem,.
Depois do sucesso estrondoso de A Night At The Opera e Duck Soup o filme seguinte dos irmãos Marx é, a meu ver, um gigantesco passo atrás. Nada comparado com o caos e a rapidez dos gags físicos dos anteriores e com um plot que tem tantos eventos que acaba por não seguir para lado nenhum. Não deixa no entanto de ser agradável, algumas sequências são memoráveis e número musical "who's that man" pode pecar por um ligeiro racismo ingénuo mas só lhe dá um encanto datado.
Tudo revira à volta de um hospital de repouso que está prestes a abrir falência mesmo se ao lado está uma pista de cavalos constantemente cheia. Para manter o hospital aberto ainda mais um mês entra uma cinquentenária rica que exige a presença de um certo médico (Groucho) embora ele seja na realidade um veterinário. Na teoria é um típico setting Marxiano mas o plot secundário deixa tudo a perder por nenhum dos irmãos fazer parte dele, o interesse amoroso da directora do hospital começa a criar um cavalo para as corridas e com o dinheiro investir no negócio dela e isto enquanto um grupo de pessoas desejosos de ver a pobre rapariga na bancarrota tentam provar que Groucho está a fingir na sua profissão.
Os próprios irmãos passam a maior parte do tempo sem espírito, Groucho repete gags anteriores e Harpo perde muito da sua imprevisibilidade dos filmes anteriores parecendo por vezes um grupo de fãs a tentar imitá-los e no seu caso, e apenas dois anos antes de A Night At The Opera, acaba por ser quase constragedor.
Não é um mau filme, dentro dos cânones uma má obra dos Marx é sempre das melhores comédias que se podem encontrar, mas depois de sabermos que eles são capazes de desvaires tão insanos como os anteriores acabar por os testemunhar em ponto-morto não sabe tão bem,.
Thursday, 20 September 2007
Tudo Isto É Cinema I
THE APE MAN (1943)
de William Beaudine
Quem viu Ed Wood de Tim Burton apanhou um espectacular relato dos últimos dias de Lugosi quando a sua carreira estava já em putrefacção. Mas antes do histórico húngaro ser ofendido por Abbot e Costello já este era um actor secundário de veículos para Boris Karloff e isso era pautado com graças de protagonista em filmes tão maus que cada vez mais o atiravam para o esquecimento colectivo, ao contrário do seu nemésis Karloff. Infelizmente este Ape Man faz parte desse segundo grupo de filmes e daí talvez não tão infelizmente porque a falta de qualidade de toda a produção quase que consegue ofuscar o Lugosi ridículo nunca ameaçante e numa maquilhagem que só faz parecer que ele tem uma barba de Hamish em vez de o fazer parecer com uma criatura metade-gorila/metade-humano.
A história começa com duas vertentes, a irmã de Lugosi regresa à cidade deste para descobrir que o irmão cientista serviu de cobaia para as suas experiências com um gorila e é agora metade animal selvagem e ao mesmo tempo uma personagem estranha avisa um jornalista do que se passa na casa do cientista louco numa qualquer relação com fantasmas. Lugosi começa a percorrer a cidade à procura de vítimas para extrair o liquido cefaloraquidiano das suas vértrebas e assim poder curar-se e por curar digo deixar de andar curvado como um gorila. Enquanto isso o jornalista lá deixa umas piadas machistas à sua fotógrafa, a polícia tenta descobrir o paradeiro de Lugosi e aquela personagem estranha do início aparece quando lhe apetece e no fim embrulha tudo na resolução mais estúpida que há memória.
E Lugosi que mete pena ao continuar a manter o seu forte sotaque húngaro que tão bem funcionava no Drácula mas aqui serve de cereja no topo deste desastre do terror dos anos 40.
Mas há uma boa forma de ver este filme, numa sessão dupla com outro do género com um grupo de cinéfilos que também têm especial carinho por Lugosi. Aí este Ape Man começa uma grandiosa noite de cinema esquecido.
LADY SNOWBLOOD (1973)
de Toshiya Fujita
As histórias de vingança foram proeminentes na maioria dos filmes de acção asiática mais importantes. Como The 36th Chamber Shaolin dos estúdios dos irmãos Shaw ou mesmo mais recentemente Oldboy do sul-coreano Chan-wook Park trataram de recorrer ao tema do herói sem rumo para além do seu objectivo principal de vingança dura e fria. Lady Snowblood acaba no entanto por ser o mais estilizado destes três e talvez ainda o mais cru.
Nascida numa prisão, Shurayuki-hime é criada e treinada desde de criança com o objectivo de vingar a morte do pai e do irmão mais velho e das constantes violações que a mão foi submetida antes de ser presa e morrer durante o parto. Os quatro capítulos que dividem a história são para cada um dos intervenientes que Yuki tem que assassinar para assim cumprir o seu objectivo de nascença percorrendo o país até, da forma certa, conseguir fazer a justiça da espada. Incrivelmente a sua personagem não aprende nenhuma lição de vida, cada capítulo começa com a calma de Yuki à procura da próxima vítima e termina com um duelo sangrento, daí que o único desenvolvimento seja feito de retrospectivas do seu passado (o treino duro, a história que a sua mão conta antes de morrer) e de uma cena perto do fim em que ela não sabe o que vai acontecer agora que o seu objectivo de vida foi cumprido.
É assustador ver uma história de vingança com uma personagem que não parece tirar nenhuma moral da mesma embora nos digam a meio do filme que Yume ainda tem uma réstia de sentimento em si e admita-se que é suficiente para aceitarmos esta personagem em toda a sua glória.
Magnífico filme de artes marciais com cenas de acção hiperbólicas e sangue a jorrar como se se tratasse de um filme de animação japonesa. Lady Snowblood acaba por isso ser a estrutura para Tarantino fazer o seu díptico de vingança também com uma mulher a ter que assassinar os quatro principais intervenientes de uma catástrofe em que ela esteve directamente envolvida. Há mesmo planos de Kill Bill que foram copiados a papel químico de Lady Snowblood mas a homenagem atinge carácter de devoção quando Tarantino usa no final do primeiro volume a música principal do filme japonês.
A descobrir urgentemente ao lado de The 36th Chamber Shaolin.
de William Beaudine
Quem viu Ed Wood de Tim Burton apanhou um espectacular relato dos últimos dias de Lugosi quando a sua carreira estava já em putrefacção. Mas antes do histórico húngaro ser ofendido por Abbot e Costello já este era um actor secundário de veículos para Boris Karloff e isso era pautado com graças de protagonista em filmes tão maus que cada vez mais o atiravam para o esquecimento colectivo, ao contrário do seu nemésis Karloff. Infelizmente este Ape Man faz parte desse segundo grupo de filmes e daí talvez não tão infelizmente porque a falta de qualidade de toda a produção quase que consegue ofuscar o Lugosi ridículo nunca ameaçante e numa maquilhagem que só faz parecer que ele tem uma barba de Hamish em vez de o fazer parecer com uma criatura metade-gorila/metade-humano.
A história começa com duas vertentes, a irmã de Lugosi regresa à cidade deste para descobrir que o irmão cientista serviu de cobaia para as suas experiências com um gorila e é agora metade animal selvagem e ao mesmo tempo uma personagem estranha avisa um jornalista do que se passa na casa do cientista louco numa qualquer relação com fantasmas. Lugosi começa a percorrer a cidade à procura de vítimas para extrair o liquido cefaloraquidiano das suas vértrebas e assim poder curar-se e por curar digo deixar de andar curvado como um gorila. Enquanto isso o jornalista lá deixa umas piadas machistas à sua fotógrafa, a polícia tenta descobrir o paradeiro de Lugosi e aquela personagem estranha do início aparece quando lhe apetece e no fim embrulha tudo na resolução mais estúpida que há memória.
E Lugosi que mete pena ao continuar a manter o seu forte sotaque húngaro que tão bem funcionava no Drácula mas aqui serve de cereja no topo deste desastre do terror dos anos 40.
Mas há uma boa forma de ver este filme, numa sessão dupla com outro do género com um grupo de cinéfilos que também têm especial carinho por Lugosi. Aí este Ape Man começa uma grandiosa noite de cinema esquecido.
LADY SNOWBLOOD (1973)
de Toshiya Fujita
As histórias de vingança foram proeminentes na maioria dos filmes de acção asiática mais importantes. Como The 36th Chamber Shaolin dos estúdios dos irmãos Shaw ou mesmo mais recentemente Oldboy do sul-coreano Chan-wook Park trataram de recorrer ao tema do herói sem rumo para além do seu objectivo principal de vingança dura e fria. Lady Snowblood acaba no entanto por ser o mais estilizado destes três e talvez ainda o mais cru.
Nascida numa prisão, Shurayuki-hime é criada e treinada desde de criança com o objectivo de vingar a morte do pai e do irmão mais velho e das constantes violações que a mão foi submetida antes de ser presa e morrer durante o parto. Os quatro capítulos que dividem a história são para cada um dos intervenientes que Yuki tem que assassinar para assim cumprir o seu objectivo de nascença percorrendo o país até, da forma certa, conseguir fazer a justiça da espada. Incrivelmente a sua personagem não aprende nenhuma lição de vida, cada capítulo começa com a calma de Yuki à procura da próxima vítima e termina com um duelo sangrento, daí que o único desenvolvimento seja feito de retrospectivas do seu passado (o treino duro, a história que a sua mão conta antes de morrer) e de uma cena perto do fim em que ela não sabe o que vai acontecer agora que o seu objectivo de vida foi cumprido.
É assustador ver uma história de vingança com uma personagem que não parece tirar nenhuma moral da mesma embora nos digam a meio do filme que Yume ainda tem uma réstia de sentimento em si e admita-se que é suficiente para aceitarmos esta personagem em toda a sua glória.
Magnífico filme de artes marciais com cenas de acção hiperbólicas e sangue a jorrar como se se tratasse de um filme de animação japonesa. Lady Snowblood acaba por isso ser a estrutura para Tarantino fazer o seu díptico de vingança também com uma mulher a ter que assassinar os quatro principais intervenientes de uma catástrofe em que ela esteve directamente envolvida. Há mesmo planos de Kill Bill que foram copiados a papel químico de Lady Snowblood mas a homenagem atinge carácter de devoção quando Tarantino usa no final do primeiro volume a música principal do filme japonês.
A descobrir urgentemente ao lado de The 36th Chamber Shaolin.
Tuesday, 18 September 2007
Fur: An Imaginary Portrait Of Diane Arbus (2006)
de Steven Shainberg
Shainberg não um realizador que toda a gente possa falar. Os seus primeiros filmes são completamente desconhecidos embora tenham a participação de, na altura, grandes promessas e actores já com obra edificada (William H. Macy, Angelina Jolie, Phillip Baker Hall, etc.) e só na sua terceira obra é que começa a rodar o seu nome. Poucos se lembram mas aqueles que tiveram a oportunidade de ver o belíssimo Secretary dificilmente esquecem, mesmo se a temática fosse desequilibrada para alguns não se esquece a Maggie Gyllenhaal, o James Spader, a música do Badalamenti mas, acima de tudo a romantização do fetichismo, nada normal mesmo em filmes independentes.
Obra seguinte e Shainberg falha em fazer passar a palavra do seu filme entre o culto. Esforça-se, mostra o mesmo respeito pelos sexualmente inadaptados, uma personagem similar à Gyllenhaal do Secretary e quase o mesmo estilo de mise-en-scéne adaptado ao falso biopic de época. O que o anterior estava para o sado-masoquismo está este FUR para o voyeurismo e só por isso o filme tem tudo para funcionar perfeitamente.
Só que falha em dar um passo de risco como o anterior o fez embora tudo seja bem pensado, o argumento é consistente fora o desenvolvimento de Diane com as filhas que ora ficamos com a sensação de que ela as está a negligenciar sem remorsos ora a história secundária da filha mais velha esteja muito mal desenvolvida. Os actores esses merecem todo o respeito do mundo, Nicole Kidman dá o corpo ao manifesto em formato Gyllenhaal mais velha mas nem por isso menos apetecível e, claro, Robert Downey Jr. é gigantesco no papel de homem-lobo letrado e fruto do desejo da personagem feminina.
O que falha são os mínimos porque de resto o filme não deixa nunca uma sensação de vazio e até a fotografia (Bob Pope outra vez num trabalho excepcional) e a música estão em primeiro plano.
O biopic falso ainda consegue funcionar por causa do subtítulo no início acima de tudo humilde que informa o espectador que a adaptação não é só livre, é completamente fictícia para assim melhor fazer jus ao que a fotografa Diane Arbus significa para esse mundo doentio e romântico de Shainberg. É mais do que suficiente para levar a obra a sério, mesmo que o efeito da mesma não seja igual ao bojardo do filme anterior.
Ainda assim nota positiva para este novo Shainberg.
Shainberg não um realizador que toda a gente possa falar. Os seus primeiros filmes são completamente desconhecidos embora tenham a participação de, na altura, grandes promessas e actores já com obra edificada (William H. Macy, Angelina Jolie, Phillip Baker Hall, etc.) e só na sua terceira obra é que começa a rodar o seu nome. Poucos se lembram mas aqueles que tiveram a oportunidade de ver o belíssimo Secretary dificilmente esquecem, mesmo se a temática fosse desequilibrada para alguns não se esquece a Maggie Gyllenhaal, o James Spader, a música do Badalamenti mas, acima de tudo a romantização do fetichismo, nada normal mesmo em filmes independentes.
Obra seguinte e Shainberg falha em fazer passar a palavra do seu filme entre o culto. Esforça-se, mostra o mesmo respeito pelos sexualmente inadaptados, uma personagem similar à Gyllenhaal do Secretary e quase o mesmo estilo de mise-en-scéne adaptado ao falso biopic de época. O que o anterior estava para o sado-masoquismo está este FUR para o voyeurismo e só por isso o filme tem tudo para funcionar perfeitamente.
Só que falha em dar um passo de risco como o anterior o fez embora tudo seja bem pensado, o argumento é consistente fora o desenvolvimento de Diane com as filhas que ora ficamos com a sensação de que ela as está a negligenciar sem remorsos ora a história secundária da filha mais velha esteja muito mal desenvolvida. Os actores esses merecem todo o respeito do mundo, Nicole Kidman dá o corpo ao manifesto em formato Gyllenhaal mais velha mas nem por isso menos apetecível e, claro, Robert Downey Jr. é gigantesco no papel de homem-lobo letrado e fruto do desejo da personagem feminina.
O que falha são os mínimos porque de resto o filme não deixa nunca uma sensação de vazio e até a fotografia (Bob Pope outra vez num trabalho excepcional) e a música estão em primeiro plano.
O biopic falso ainda consegue funcionar por causa do subtítulo no início acima de tudo humilde que informa o espectador que a adaptação não é só livre, é completamente fictícia para assim melhor fazer jus ao que a fotografa Diane Arbus significa para esse mundo doentio e romântico de Shainberg. É mais do que suficiente para levar a obra a sério, mesmo que o efeito da mesma não seja igual ao bojardo do filme anterior.
Ainda assim nota positiva para este novo Shainberg.
Monday, 17 September 2007
The Day The Earth Stood Still (1951)
De Robert Wise
Desde os últimos sete anos que a industria cinematográfica começou a concentrar as suas forças das metáforas de natureza política ao invés do retrato social dos fim da década de 90. É um força imbatível essa que nem a máquina comercial de Hollywood se consegue escapar, diz o livro de regras do executivo americano que se deve dar aquilo que o público quer mas na linha seguinte já se fala do cinema como escapismo. Ora esse público não quer rever as tristes notícias da noite no cinema (e assim o diz o livro de regras do espectador comum) e a referência 11 de setembro/guerra no iraque não faz partes do plano de quem quer assistir ao novo filme de acção ou à nova comédia com antigos elementos do SNL. A afirmação tem uma grande falácia já que não é o espectador que decide o que quer ver mas sim o bom realizador. O bom realizador que agarrou o fantasma de Nova-Iorque pelos cornos no A Última Hora ou aquele que homenageou vítimas desse dia de 2001 no United 93 ou outros filmes que nos últimos anos têm aparecido com a temática 9-11/Afeganistão/Iraque em grande plano e não há corolário nenhum que venha contrariar essa tendência dos argumentistas e realizadores lutarem contra a leveza das ideias dos produtores e mostrar tiros, pontapés, explosões e palhaçadas com uma referência que ligue a obra à triste realidade. Foi assim no pós-Vietname, na Inglaterra de Thatcher e sempre assim irá continuar.
Demora é um grande estúdio financiar uma super-produção onde a metáfora está tão propositadamente mal mascarada que só pode ter sido intenção do realizador para passar a mensagem com maior clareza. Robert Wise foi o pioneiro na Guerra Fria que fez o filme de ficção-científica com os pés mais assentes na Terra daquela época. Para se ver a dimensão do filme reparem que a ficção-científica com seres alienígenas estava em voga na altura desde que Orson Wells leu A Guerra dos Mundos de H.G. Wells na rádio e provocou pânico no país inteiro, aliás uma das cenas iniciais desde The Day The Earth Stood Still mostra um grupo de pessoas a ouvir a rádio onde o locutor avisa que isto não é uma brincadeira, da mesma forma que os filmes de acção com testosterona e bícepes a mais levavam o mundo inteiro à sala nos anos 80 ou as adaptações de B.D. levam agora.
Estava-se numa altura em que os efeitos especiais eram limitados portanto usados para o mínimo possível da "suspension of disbelief" logo a história teria que ter uma força bem mais proeminente. Para além disso, estavamos no começo da guerra-fria e os argumentistas e realizadores não se podem esconder do estado do mundo e como ainda não eram lavados pelo nacionalismo americano anti-comunista havia, acima de tudo, medo do futuro mais do que noutra década qualquer.
The Day The Earth Stood Still partia do cenário de invasão extra-terrestres mas rapidamente muda para a hostilidade humana quando um soldado dispara contra o alienígena Klaatu. De repente o filme de ficção-científica que entrava dentro dos cânones do nosso planeta a ser ameaçado tornava-se numa calma constatação na nossa estrutura social com Klaatu a descobrir aos poucos como são os humanos e a admirar-se com as palavras escritas por Abraham Lincoln. Basicamente Klaatu analisa em vez de atacar e a sua resolução ainda é mais pacífica. De volta à Guerra Fria, num mundo que estava completamente dividido seria de esperar que um estúdio gigante financiasse uma produção completamente pró-valores americanos, em vez disso temos o medo da resolução do conflito em evidência. É uma época em que as pessoas queriam mais paz do que uma vitória norte-americana, a Bomba Atómica tinha sido apresentado meia dúzia de anos antes e era o principal receio que fosse a ferramenta principal da aniquilação total da raça humana. The Day The Earth Stood Still reflecte esse desejo pacífico e o invasor não está so cheio de boas intenções como põe à prova a união diplomática entre os povos da Terra.
No fim há pouco sinal de esperança. Afinal a principal ameaça vem de nós mesmo, numa jogada que considero arriscada o nome da ciência é posto em causa quando confrontado com as intempéries políticas, se calhar a solução está no conhecimento humano mas mesmo esse é encoberto por jogadas de medo de represálias por políticos.
Para o ano estreia o repensar da história nas mãos de um realizador medíocre sem estofo para um projecto desta importância e com Keanu Reeves no papel de Klaatu, escolha péssima. Sob pena da ideia original ser conspurcada por uma cena de acção desprovida de sentimento, que o filme original não tem, e de se perder o passo calmo e observador da obra original em detrimento de uma cena de suspense em cada 10 páginas do argumento resta ainda saber se de facto este filme será importante nos dias de hoje? 1951 era um ano de nações de costas voltadas e o filme reforça a ideia de todos se juntarem à volta do extra-terrestre para ouvir o que ele tem para dizer e analisar a sua solução, o novo milénio são anos de divisão cultural com a religião em grande-plano. Se o novo seguir essa ordem pode sair um bom novo update da história, se nos tentarem impingir outra vez Iraques e afins então mais vale deixar o filme na prateleira que o medo já não é o mesmo.
Desde os últimos sete anos que a industria cinematográfica começou a concentrar as suas forças das metáforas de natureza política ao invés do retrato social dos fim da década de 90. É um força imbatível essa que nem a máquina comercial de Hollywood se consegue escapar, diz o livro de regras do executivo americano que se deve dar aquilo que o público quer mas na linha seguinte já se fala do cinema como escapismo. Ora esse público não quer rever as tristes notícias da noite no cinema (e assim o diz o livro de regras do espectador comum) e a referência 11 de setembro/guerra no iraque não faz partes do plano de quem quer assistir ao novo filme de acção ou à nova comédia com antigos elementos do SNL. A afirmação tem uma grande falácia já que não é o espectador que decide o que quer ver mas sim o bom realizador. O bom realizador que agarrou o fantasma de Nova-Iorque pelos cornos no A Última Hora ou aquele que homenageou vítimas desse dia de 2001 no United 93 ou outros filmes que nos últimos anos têm aparecido com a temática 9-11/Afeganistão/Iraque em grande plano e não há corolário nenhum que venha contrariar essa tendência dos argumentistas e realizadores lutarem contra a leveza das ideias dos produtores e mostrar tiros, pontapés, explosões e palhaçadas com uma referência que ligue a obra à triste realidade. Foi assim no pós-Vietname, na Inglaterra de Thatcher e sempre assim irá continuar.
Demora é um grande estúdio financiar uma super-produção onde a metáfora está tão propositadamente mal mascarada que só pode ter sido intenção do realizador para passar a mensagem com maior clareza. Robert Wise foi o pioneiro na Guerra Fria que fez o filme de ficção-científica com os pés mais assentes na Terra daquela época. Para se ver a dimensão do filme reparem que a ficção-científica com seres alienígenas estava em voga na altura desde que Orson Wells leu A Guerra dos Mundos de H.G. Wells na rádio e provocou pânico no país inteiro, aliás uma das cenas iniciais desde The Day The Earth Stood Still mostra um grupo de pessoas a ouvir a rádio onde o locutor avisa que isto não é uma brincadeira, da mesma forma que os filmes de acção com testosterona e bícepes a mais levavam o mundo inteiro à sala nos anos 80 ou as adaptações de B.D. levam agora.
Estava-se numa altura em que os efeitos especiais eram limitados portanto usados para o mínimo possível da "suspension of disbelief" logo a história teria que ter uma força bem mais proeminente. Para além disso, estavamos no começo da guerra-fria e os argumentistas e realizadores não se podem esconder do estado do mundo e como ainda não eram lavados pelo nacionalismo americano anti-comunista havia, acima de tudo, medo do futuro mais do que noutra década qualquer.
The Day The Earth Stood Still partia do cenário de invasão extra-terrestres mas rapidamente muda para a hostilidade humana quando um soldado dispara contra o alienígena Klaatu. De repente o filme de ficção-científica que entrava dentro dos cânones do nosso planeta a ser ameaçado tornava-se numa calma constatação na nossa estrutura social com Klaatu a descobrir aos poucos como são os humanos e a admirar-se com as palavras escritas por Abraham Lincoln. Basicamente Klaatu analisa em vez de atacar e a sua resolução ainda é mais pacífica. De volta à Guerra Fria, num mundo que estava completamente dividido seria de esperar que um estúdio gigante financiasse uma produção completamente pró-valores americanos, em vez disso temos o medo da resolução do conflito em evidência. É uma época em que as pessoas queriam mais paz do que uma vitória norte-americana, a Bomba Atómica tinha sido apresentado meia dúzia de anos antes e era o principal receio que fosse a ferramenta principal da aniquilação total da raça humana. The Day The Earth Stood Still reflecte esse desejo pacífico e o invasor não está so cheio de boas intenções como põe à prova a união diplomática entre os povos da Terra.
No fim há pouco sinal de esperança. Afinal a principal ameaça vem de nós mesmo, numa jogada que considero arriscada o nome da ciência é posto em causa quando confrontado com as intempéries políticas, se calhar a solução está no conhecimento humano mas mesmo esse é encoberto por jogadas de medo de represálias por políticos.
Para o ano estreia o repensar da história nas mãos de um realizador medíocre sem estofo para um projecto desta importância e com Keanu Reeves no papel de Klaatu, escolha péssima. Sob pena da ideia original ser conspurcada por uma cena de acção desprovida de sentimento, que o filme original não tem, e de se perder o passo calmo e observador da obra original em detrimento de uma cena de suspense em cada 10 páginas do argumento resta ainda saber se de facto este filme será importante nos dias de hoje? 1951 era um ano de nações de costas voltadas e o filme reforça a ideia de todos se juntarem à volta do extra-terrestre para ouvir o que ele tem para dizer e analisar a sua solução, o novo milénio são anos de divisão cultural com a religião em grande-plano. Se o novo seguir essa ordem pode sair um bom novo update da história, se nos tentarem impingir outra vez Iraques e afins então mais vale deixar o filme na prateleira que o medo já não é o mesmo.
Saturday, 15 September 2007
Top 5 de séries de televisão em três categorias
Drama
The Sopranos
O David Chase é uma personagem estranha. Tem um currículo invejável que passa por obras de televisão de culto onde escreveu episódios de, entre outros, "Alfred Hitchcock presents..." e "Northern Exposure" e mesmo assim, mesmo estando entre os mais promissores argumentistas e produtores norte-americanos, acaba por ficar na televisão a preparar as suas séries com uma metedologia incrível como se o argumento de cada episódio tivesse a chave para a boa qualidade da mesma. E depois, em 1999 lança a bomba em formato Tony Soprano que no fim parecia uma espécie de versão serializada das obras do Mario Puzo embora consciente que a "cosa nostra" de agora era diferente da do pós-Vietname. O resultado é em tudo uma série do mais completo que há e que parte de uma ideia base incrível - Tony Soprano é um patrão da máfia em Newark e tem que tratar de problemas da sua família e da sua "família" tendo como apoio as sessões com a sua psicóloga. Tony é o anti-herói perfeito mas não é nada sem o leque de personagens secundárias que o circundam, aliás todo o poder da série vem do trabalho dos actores e do argumento cujas reacções deles me faz mesmo acreditar que alguém com aquelas particularidades psicológicas poderia reagir assim. Digo mesmo que nunca fiquei tão impressionado com a verosimilhança dos intervenientes como aqui, nem mesmo em nenhum outro filme já feito e prova grande a paciência do David Chase, que só segue para as filmagens quando todos os episódios estiverem escritos e preparados nem que demore dois anos a o fazer.
Twin Peaks
É o grande espelho da minha relação agridoce que tenho com o David Lynch. Tanto posso ficar impressionado e idolatrar alguns dos seus filmes como me desinteresso por outros. A primeira temporada de Twin Peaks faz parte do primeiro caso. Oito episódios grandiosos em formato telenovelístico que tem mais de sátira do estado da televisão moderna que de thriller psicológico. Depois a segunda temporada, bem, a segunda temporada acho um bluff gigantesco e quase ofensivo que só vale mesmo pelo enorme Kyle MacLachlan que consegue levar a série aos ombros mesmo quando esta já parece perder o seu sentido. No entanto, e mesmo se me achei enganado pelo desenrolar do segundo ano, os primeiros oito episódios são do melhor que a televisão já nos ofereceu e ainda protagonistas de um fenómeno curioso, na época Twin Peaks movia mais tinta que as teorias sobre o Lost e anos mais tarde com o mercado de DVDs e o nome Lynch bem edificado na nossa cultura audiovisual houve um renascimento do culto da mesma e novos fãs entraram no circulo de adulação à série. Engraçado que o nome Lynch foi crucial, outros grandes trabalhos do género (como o injustamente esquecido "Wild Palms - Palmeiras Bravas") não tiveram a mesma sorte.
Six Feet Under
Duas pessoas que conheço disseram em alturas e locais diferentes "God Bless Alan Ball" quando acabaram de ver o último episódio da grande saga da família Fisher criada por um dos argumentistas mais criativos do novo cinema americano, embora só tenha assinado uma obra no grande ecrã que lhe valeu logo um Óscar e um rol infindável de reconhecimentos e prémios. A série, que durante 5 anos desenvolveu a psyche dos membros de umas das famílias mais disfuncionais da televisão norte-americana, soube quase sempre manter um nível superior mesmo se cada episódio caísse mais nos berros e nas queixas de Nate, David, Brenda e Claire do que propriamente nas resoluções dos seus problemas, mas não sei como seria de outra forma se isto são personagens que passam a maior parte do tempo a invocar os seus fantasmas do que a fazer propriamente alguma coisa para se salvarem. Daí grande parte do encanto daquela última sequência onde, pela primeira vez, alguém dá um passo em frente e procura salvação, ou, como canta a Sia na mesma sequência, exige salvamento.
24
Há qualquer coisa que não devia funcionar nas aventuras do Jack Bauer. O cuidado com o tempo é por vezes espalhafatoso (não há crepúsculo, passa logo de sol radiante para o breu da noite), os lapsos temporais de cada série fazem com que a personagem principal devesse ter agora quase 65 anos e aquela terceira temporada é muito estranha no plano narrativo.
Mas a acção perdura e a série consegue um recorde de "cliffhangers" impressionantes que eu não consigo deixar em passar em branco. É uma gestão impressionante de situações onde o término de que tudo que pode correr mal, correrá, consegue ter outra dimensão e quando se atinge o "worst case scenario" quem é a única pessoa capaz de resolver a situação? Jack Bauer, apoiado pela sua mega-equipa de nerds da CTU na des-humana luta contra terroristas que todos os anos querem eliminar metade da população de Los Angeles ou simplesmente assassinar o senador/presidente/senador David Palmer. É televisão excitante que nenhum mal faz e 1 hora por semana bem precisamos de nos sentar na beira do sofá à espera que o Jack se desembrulhe daquela situação que parece não ter resolução possível mas que ele lá encontra forma de nos surpreender.
E que dizer do enorme Keifer Sutherland que descobriu aqui papel para a vida inteira e sina para qualquer type-casting futuro? E na terceira série o nosso Joaquim de Almeida num tremendo over-acting? E a Elisha Cuthbert a...bem, a mostrar uma carinha laroca nunca fez mal a ninguém.
Heroes
E terminada a primeira temporada entra Heroes no panteão das melhores séries tudo porque é sempre um prazer ver uma homenagem à nova-cultura geek em tão grande escala. Confessou Tim Kring, o criador, que a equipa de argumentistas visita frequentemente forums sobre a série para saber a opinião dos fãs e ter ideias para resoluções futuras. Merece mesmo uma análise em como a contra-cultura está directamente relacionada às altas entidades artísticas nos dias de hoje e que nalguns casos uma não existe sem a outra. Mas a série propriamente dita merece outra espécie de elogios. Primeiro saber gerir bem os mistérios e não deixar em desespero os seus fãs (síndrome LostTwin Peaks) e depois o facto de como um simples lugar-comum da cultura da banda-desenhada norte-americana pode ainda dar lugar a uma original, interessante e viciante história. Pontos positivos ainda para o grande Hiro Nakamura, o japonês que controla o espaço e o tempo, que mesmo sendo uma personagem secundária basicamente rouba o espectáculo todo e consegue ser cara mais memorável e adorável da série. É o perfeito exemplo da qualidade da televisão norte-americana em comparação à pobreza de muitos blockbusters do grande-ecrã: como fazer uma história com super-heróis, com bons efeitos especiais sem recorrer à pobreza da gestão bidimensional das personagens.
Quem não viu não sabe o que está a perder e deve JÁ pôr as mãos nesta primeira temporada que acabou. Quem já viu sabe do que falo e anseia por Outubro quando se vai saber como vai continuar as aventuras de Hiro, dos irmãos Petrelli, da bela Claire, etc.
Lugares de Honra
Duarte & Cª; Wild Palms; Twilight Zone; Alfred Hitchcock Presents...; Taken; Amazing Stories; Lost; O Polvo; Riget - O Reino; Firefly
Sitcom/comédia
The Office
A série que nos trouxe o monstro Ricky Gervais e parece que tudo o que de lá saiu é moldado em material de primeira qualidade. Mas primeiro está Ricky, ou melhor, David Brent. O patrão mais execrável da história da televisão britânica é rei e senhor de situações de comédia tão constrangedoras que já não se via desde o enorme Alan Partridge do Steve Coogan ou o histórico e hilariante Basil Fawlty do John Cleese. Dói ver aquela pobre alma que é logo descrita no fim do primeiro episódio pela sua secretária como "you sad pathetic little man". Desde então é sempre a descer.
No futuro, e depois do fabuloso especial de Natal, Ricky trouxe Extras outra vez com o seu argumentistas companheiro Stephen Merchant que desta vez entra como actor, num resultado fabuloso para fãs dos dois. O remake americano com Steve Carell no papel de David Brent é, imagine-se, fabuloso (ou nem fosse apadrinhado pelo próprio Gervais que ainda escreveu um ou outro episódio); Martin Freeman saiu do escritório para se tornar num óptimo actor de cinema com a honra de ter sido um óptimo Arthur Dent na adaptação cinematográfica de "Hitchhikker's guide to the galaxy". E Gervais, esse passeia-se sobre os seus louros, merecidamente, e deixa-nos na expectativa do seu próximo projecto já que, até agora, tudo o que ele toca se transforma em ouro.
Fawlty Towers
Devo ter alguma coisa por personagens detestáveis. Ele é David Brent, ele é Alan Partridge, ele é Black Adder. Mas admita-mos que destes todos o seu mestre é o único e incomparável Basil Fawlty, o dono de um hotel no centro de Inglaterra, racista, xenófobo, pomposo, ignorante e tudo o que pode haver de pior. É incrível como é que aguentou tanto tempo a gerir um hotel com a sua mulher se ele, literalmente, detesta todos os clientes que por lá passam e pior ainda, faz questão de o dizer. No fim ele consegue mover a série inteira só por abrir a boca, só porque imitar Adolf Hitler à frente de um grupo de hóspedes alemães. Nunca as comédias de situação conseguiram criar settings tão caóticos em apenas dez minutos e o pior é que no fim nada está bem e as personagens não se sentam à volta a fogueira a cantar, não, normalmente os hóspedes fogem e deixam o Basil numa posição embaraçosa à frente da sua mulher e de outros clientes, aos berros e a mal dizer tudo e todos porque nunca a culpa é dele.
Aliás, só por si, só pelo John Cleese na pele de Basil, que a série tinha tudo para funcionar mas o que acabou por se transformar foi num fenómeno que ainda hoje é inspiração para novos projectos britânicos, americanos e mesmo em Portugal.
Scrubs
O sentimento de "feel-good" atravessa todos os poros desta série ao ponto da personagem principal, o Doutor John Dorian ou J.D. (um óptimo Zach Braff), parecer por vezes a criatura mas irritantemente feliz do planeta. E quando isso acontece entram os outros, entra o alter-ego de JD na papel do Doutor Cox ou o nemésis Janitor e a série salva-se de se tornar num arraial de boas intenções e consegue mesmo dar lugar ao humor negro e nonsense mas sempre com boas intenções, sempre. Gosto do Bill Lawrence que já tinha provado com o óptimo Spin City - aquela série de comédia com o Michael J. Fox passada nos bastidores da câmara municipal de Nova Iorque - que é um óptimo argumentista de comédia sem recorrer à escatalogia, à piada fácil ou à crítica social. O seu estilo de escrita à clássico mas bem definido e é nesse aspecto que Scrubs parece ser onde ele está como um peixe no oceano. Todos as histórias começam com as personagens em total harmonia, há um inciting incident pouco tempo depois, um segundo acto bem estruturado, um clímax (principalmente com uma boa música na banda sonora a passar) e a resolução do problema dramático e pronto, alguém aprendeu a lição e tudo ficou bem. É extremamente académico mas nada disso serve de empecilho para melhor tomar partido da série, principalmente porque esta sabe parodiar-se a si mesma e transmitir boas intenções aos seus espectadores. Nada melhor para uma vez por semana durante meia-hora e a verdade é que no fim de cada episódio sentimo-nos muito zen e com a impressão que não há nada de mal neste mundo.
Seinfeld
A série que chegou viu e venceu quando ninguém estava à espera. Um baú de personagens e catchphrases mais prolífero que os Monty Python e um dos símbolos da televisão americana da década passada. E isto tudo para falar sobre...nada. Acredito que ainda hoje Jerry Seinfeld e os seus companheiros se riam em como conseguiram levar a sua avante e pôr toda a gente a dizer "NO SOUP FOR YOU" sem saberem mesmo porquê. Quer dizer, não é que antes tivéssemos visto personagens a chegar, aleatoriamente no meio de uma história, a dizer que vão abrir uma loja para vender a parte de cima de queques. Vêem onde quero chegar? Jerry Seinfeld e companhia faziam parte de uma parada de situações sem sentido que numa outra sitcom qualquer viriam da boca da personagem idiota, e aqui são motor para episódios de pura comédia genial que tudo vai buscar à tradição stand-up do seu protagonista principal. Conscientes do sucesso e, principalmente, do fenómeno que a série era, Larry David e Jerry Seinfeld fazem o impensável e passam a escrever sobre, imagine-se, uma cadeia de televisão apresentar uma ideia a Jerry Seinfeld para este fazer uma série sobre a sua vida, isto é, sobre exactamente nada! Quer dizer, se até ali andavam a escrever sobre eles mesmos e as suas experiências de vida (Jerry é...Jerry, Kramer é uma personagem famosa da cena de Nova-Iorque e George Constanza é Larry David) então o passo mais óbvio seria passarem a escrever sobre o dia em que alguém na NBC teve a estúpida ideia de pedir a estes dois para fazerem uma série sobre eles próprios. Estúpida porque nunca ninguém no seu perfeito juízo alguma vez faria uma coisa do género mas felizmente houve um executivo daa NBC que naquele ano não tomou os seus medicamentos e foi a nossa cultura que ficou a ganhar.
Depois de um final que deixou saudades e das pausadas edições em DVD da série, os fãs puderam assistir ao nascimento de Curb Your Enthusiasm, uma espécie de Seinfeld só, e com, sobre Larry David. E até agora, em cinco temporadas, parece estar-se a edificar como uma das melhores séries de comédia do novo humor americano.
Arrested Development
A minha escolha das melhores séries de comédia parece faltar muitos pesos-pesados e apresentar nomes que ainda não parecem ter ganho estatuto necessário para estar nos 5 finais. A escolha tem a sua razão, assim consigo um apanhado de cinco séries diferentes que caracterizam cinco tipos diferentes de fazer comédias de situação.
De todas estas, a que é capaz de ser a mais desconhecida em Portugal, é esta. Esta pérola criada por Mitchell Hurwitz e produzida por Ron Howard foi infelizmente cancelada pela Fox, canal que a trasmitia, embora tal tenha levado a uma série de gags delirantes no decorrer da terceira e última temporada num belo caso de televisão satírica de intervenção contra a mão que os alimentava que nem o Matt Groening no Futurama se lembraria.
Arrested Development começa com a introdução de uma família do mais disfuncional desde os Jacksons. Quando o pai, George Sr. Bluth, é preso por fraude económica, traição à pátria e mais uma série de delitos, é o seu segundo filho, Michael Bluth, que tem que cuidar da família e da empresa - a mãe Lucille Bluth é uma socialite com um grave problema com o alcóol, o irmão mais velho G.O.B. Bluth (pronuncia-se Job) é um mágico falhado, o irmão mais novo Buster Bluth sempre viveu protegido pela mãe o que fez com que seja um inadaptado social com um severo caso de complexo de Édipo, a irmã gémea de Michael, Lindsay Bluth, outra socialite que adora manifestações sociais e é casada com um actor "wannabe" ex-psiquiatra (ou analrapista...sim!), Tobias Funke, com quem nunca teve sexo embora tenham uma filha, Maybe Funke por quem o filho de Michael, George Michael Bluth, está apaixonado embora esta seja sua prima. E isto é só o setting dado pelo primeiro episódio e a partir daí as coisas passam a desenrolar-se com contornos ridículos. Tudo bem narrado pelo próprio Ron Howard (terá sido a melhor coisa que Ronnie fez desde os seus tempos de Happy Days) num belo retrato da América rica do pós 11 de Setembro. São imensas as referências à Enron, Martha Stewart, guerra no Iraque + procura por Bin Laden, o Star Wars Kid uma hilariante aparição daquele pobre chinês que foi ao American Idol cantar uma música d Ricky Martin, entre outras. É uma série que daqui a 10 anos podemos voltar a ver e relembrar alguns dos elementos mais importantes da cultura pop do ínico do século mas, acima de tudo, a tristeza que é não podermos voltar a ver mais nada sobre os Bluth assim que termina o genial último episódio. Participações especiais de Zach Braff, Ben Stiller, Julia Louis-Dreyfus e Charlize Theron (esta brilha com a sua personagem) embelezam ainda mais aquela que é, infelizmente, a melhor série de sempre a ser cancelada!
Quem não viu que vá já buscar e se converta. Quem já testemunhou admita que depois de ler isto até apetece voltar a ver tudo de uma vez só.
(Um dos realizadores da série apresenta a sua estreia no cinema com Michael Cera (George Michael Bluth) no filme Superbad cujo trailer já anda por aí e parece ser óptimo, para além de vir da mente dos criadores do muito injustamente subestimado 40-Year Old Virgin)
Lugares de Honra
Cheers; Frasier; Herman Enciclopédia; Monty Python's Flying Circus; Black Adder; Densha Otoko; Freaks & Geeks; Não és homem não és nada; That 70s Show; Get Smart; Family Ties; Spaced; Green Wing; Royle Family; League of Gentlemen
Animação
The Simpsons
Fácil. Fácil de mais para começar a falar das melhores séries de animação feitas porque não se podia começar por outra coisa se não aquela que foi recentemente escolhida pela revista Time como a melhor série de sempre (animação ou live-action) e poucos são os que podem contestar essa decisão porque nenhuma outra obra teve o impacto social que a família amarela de Groening teve. Aliás, se se fizesse um apanhado dos anos 90 durante um único minuto uma das imagens que teria de aparecer seria a cara de Bart Simpson ou a grande pança de Homer. Tira-se o chapéu, principalmente porque na minha modesta opinião as últimas séries não têm sido mais fracas mas simplesmente rotineiras e pouco conscientes que as pessoas já se habituaram aos Simpsons. Mas continuam a ser boa televisão, ainda, 18 anos depois da chegada do cão Santa's Little Helper que terminou o primeiro episódio nesse longínquo Natal de 1989. E ainda mais, esta 18ª série teve excelente episódios ao nível de uma, 7ª temporada.
A par disso não consigo dizer mais nada de novo sobre esta série sem descarregar o meu amor ao Matt Groening e a sua equipa que basicamente FIZERAM a televisão do novo século. Sem esta saga os anos 90 não parecem fazer grande sentido e eu ainda tenho pesadelos do dia em que a Fox puxar a ficha e cancelar de vez e eu nunca mais poderei testemunhar Homer, Marge, Bart, Lisa e "a outra". Enquanto isso tivemos o filme que é uma óptimo apanhado de tudo o que a série tem de bom e capaz de agradar os verdadeiros fãs. Sim, não é tão magnífico como South Park: Bigger, Longer and Uncut foi, mas porra, os Simspsons estão connosco há quase duas décadas, o topo do mundo já foi atingido por eles e agora só se pode esperar por qualidade. Aliás, o The Simpsons Movie é capaz de ser dos filmes fui com menos expectativas de ser assim um obra surpreendente que me desse um murro no estômago, eu só esperava por hora e meia de Simpsons e foi uma hora e meia de Simpsons que recebi. E isso, para quem me conhece, é para mim sinónimo das melhores horas e meia que posso ter.
Futurama
O melhor do segundo trabalho televiso de Matt Gronening é que consegue completar o universo Groeninguiano que The Simpsons não podia mexer a bem da "suspension of disbelief". A verdade é que ele confessou adorar duas realidades da televisão norte-americana clássica - a família norte-americana e a ficção-científica logo é fácil relacionar isso mesmo com a própria dimensão do storytelling, da representação real ao fantástico. Futurama é tudo aquilo que The Simpsons devia ser caso se passasse no ano 3000 e só esse simples facto abre caminhos para uma dimensão nova do humor Groeninguiano que nunca tinhamos experimentado. É mais do mesmo, mas esse mesmo vem nm novo pacote, fresco e saídinho da vaca portanto ainda saboroso e preparado a experimentar. Infelizmente a Fox não se contentou por não ter ali um novo fenómeno mundial e não quis manter um delírio de sub-cultura durante muito tempo e lá cancelou a série ao fim de 4 temporadas. Felizmente que Groening e Cohen (a dupla atrás do conceito) sabiam que ainda tinham muito que explorar nas aventuras de Fry, Leela, Bender e Zoidberg e vai daí prometeram uma série de filmes direct-to-video cujo primeiro deles todos chega às prateleiras norte-americanas no próximo mês e o trailer apresentado na ComiCon de San Diego mostrou duas coisas: Fox = pôia e que aquelas personagens ainda têm muito para nos dizer. Eu espero a salivar, prometo.
The Critic
Pronto, confesso que adoro quase tudo o que sai da fábrica dos The Simpsons mas tentem provar que estou errado e que quem aprendeu a matéria lá saiu tão ou melhor preparado que um actor de comédia que começou no Saturday Night Live. David X. Cohen é uma das mentes de Futurma, Conan O'Brien...é o Conan O'Brien, Brad Bird é O melhor realizador de filmes de animação (Iron Giant, The Incredibles e recentemente Ratatouille) e depois Al Jean, Mike Reiss e Jon Vitti juntaram-se a uma série de animadores da melhor série de sempre (sic) para criar uma pequena pérola chamada "The Critic" que passou ao lado de muita gente, principalmente do nosso país. Jay Sherman (Jon Lovitz) é um Nova-Iorquino que é crítico de cinema embora seja complicado ele sair contente de qualquer filme ("This gets the highest score, 7 out of 10") e junta o seu programa de cinema semanal género Lauro Dérmio meets Roger Ebert com a sua vida cosmopolita ao lado do seu filho e do seu pai quasi-demente. A série durante as duas temporadas que passou serviu como uma bela paródia ao trabalho do execrável crítico de cinema qual bloguista a tentar cruficar a Kathleen Gomes enquanto podem, recriando maneírismos da crítica norte-americana, provar o seu desprezo por alguns trabalhos de cinema que por lá estreiam. É mel para cinéfilos, a série que infelizmente a ABC e a FOX (quem mais) não quiseram dar seguimento. Uns anos depois saíram na internet uma série de delirantes episódios grátis especiais que se baseavam somente no programa de Jay Sherman em que ele sentado na sua cadeira satirazava alguns filmes estreados na altura, de X-men 2 aos primeiros Harry Potters ou mesmo o mui gozável Pearl Harbour. Merece ser descoberta aquela que foi a primeira série analisada pelos históricos Gene Siskel e Roger Ebert no seu programa Siskel & Ebert em que recebeu Two Thumbs Up e proporcionou que os dois fossem convidados a se interpretarem a si mesmos num óptimo episódio da segunda temporada.
South Park
A uma certa altura, já o maior trabalho de Trey Parker e Matt Stone tinha reconhecimento de público e crítica e ainda um GRANDIOSO filme já adorado por todos, South Park atinge um ponto épico impensável mesmo para os seus fãs. Estamos mesmo no começo da quinta temporada e Eric Cartman, a criança que menos simpatia transmite desde que a televisão foi inventada, participa num duelo com um outro rapaz para ver quem faz o melhor chilli e no decurso da prova (em que cada um come o chilli do outro) Cartman revela como trocou as voltas ao companheiro anulando o plano que este tinha em dar de comer ao pequeno Eric um chilli com pêlos púbicos. Mas ainda vai mais além e num magnífico monólogo com o humor mais negro que nem os inagualáveis da Liga de Cavalheiros se lembrariam, Cartman explica calmamente e sem pressas como matou os pais do seu inimigo, triturou-os e assim fez o chilli que o rapaz está a comer. Eric Cartman deixou de ser aqui o responsável por pequenas brincadeiras ingénuas e tornou-se uma epítome de sadismo, o gajo, uma criança, participa num acto deliberado de homicídio e canibalismo. Como se a cena não fosse já maldita o suficiente, a criança começa a chorar em pânico sob o olhar petrificado de toda a cidade que está a assistir aos acontecimentos e que faz Cartman? Levanta-se, vai ter com o rapaz e LAMBE-LHE AS LÁGRIMAS!! Jesus, como eu não queria acreditar no que estava a ver, Trey Parker e Matt Stone tinham no início da sequência elevando a fasquia do seu humor doentio mas estavam a perder o controlo e então chega a "cherry on top", atrás aparecem os Radiohead (voz dos mesmos) a gozar com o pobre coitado que chora e a chamarem-no de maricas. O episódio termina aqui e eu ainda demorei uns minutos até voltar a fechar a boca e a única coisa que me sai depois foi uma leve gargalhada seguida de uma onomatopeia de espanto. South Park sempre serviu de exorcismo para qualquer bom ser-humano com algum sentido de humor mas o que tinha acabado de ver era um passo tão à frente que só daqui a vários anos é que lhe darão devido valor. Porquê esta revisão da melhor cena de sempre de uma das melhores séries de comédia de sempre? Pois é ela que demonstra que nada é sagrado para estes dois verdadeiros "enfants terribles", que a sua obra para a posteridade continua para surpresa de todos a disparar em todas as direcções e a ganhar inimigos por onde passa. E já vão uns 10 anos e até hoje ninguém pode negar que o mundo bem que andava a precisar destes dois.
King of the Hill
Infelizmente pouca gente percebe a beleza desta série. Não há aqui nenhuma intenção de um retrato satírico da América de hoje (i.e. The Simpsons) nem atirar gags à parede para ver qual pega (i.e. Family Guy). Aliás, de todas as séries de animação, King of the hill deve ser aquela que podia muito bem ser feita em live-action mas assim podia tornar-se mundana. A caricaturalidade das suas personagens parece bater com a mundanidade das suas histórias, quer dizer, isto são personagens do mais sulista que se pode imaginar, há aqui material para escatalogia nonsense e para bater ainda mais no nervo da América ignorante-republicana. Mas Mike Judge adora as suas personagens e só lhes quer bem, apesar de tudo aquelas pessoas simples e com problemas simples existem e mesmo se não conheço nenhum redneck como os que vemos nos filmes, conheço e prezo bem as suas versões portuguesas.
Mike Judge, esse deixa a sua escola (SNL; Beavis & Butt-head) à porta e apresenta só uma sitcom com rednecks, nada mais que isso, da mesma forma que Sex & The City bem representa a mulher nova-iorquina rica e sofisticada, também aqui se sabe pegar no redneck e valoriza-lo sem rídiculos mas com boa comédia. Espreitem ainda o interessante Office Space também da autoria de Mike Judge.
Lugares de Honra
The P.J.s; Dr. Katz; Robot Chicken; Robin
O David Chase é uma personagem estranha. Tem um currículo invejável que passa por obras de televisão de culto onde escreveu episódios de, entre outros, "Alfred Hitchcock presents..." e "Northern Exposure" e mesmo assim, mesmo estando entre os mais promissores argumentistas e produtores norte-americanos, acaba por ficar na televisão a preparar as suas séries com uma metedologia incrível como se o argumento de cada episódio tivesse a chave para a boa qualidade da mesma. E depois, em 1999 lança a bomba em formato Tony Soprano que no fim parecia uma espécie de versão serializada das obras do Mario Puzo embora consciente que a "cosa nostra" de agora era diferente da do pós-Vietname. O resultado é em tudo uma série do mais completo que há e que parte de uma ideia base incrível - Tony Soprano é um patrão da máfia em Newark e tem que tratar de problemas da sua família e da sua "família" tendo como apoio as sessões com a sua psicóloga. Tony é o anti-herói perfeito mas não é nada sem o leque de personagens secundárias que o circundam, aliás todo o poder da série vem do trabalho dos actores e do argumento cujas reacções deles me faz mesmo acreditar que alguém com aquelas particularidades psicológicas poderia reagir assim. Digo mesmo que nunca fiquei tão impressionado com a verosimilhança dos intervenientes como aqui, nem mesmo em nenhum outro filme já feito e prova grande a paciência do David Chase, que só segue para as filmagens quando todos os episódios estiverem escritos e preparados nem que demore dois anos a o fazer.
É o grande espelho da minha relação agridoce que tenho com o David Lynch. Tanto posso ficar impressionado e idolatrar alguns dos seus filmes como me desinteresso por outros. A primeira temporada de Twin Peaks faz parte do primeiro caso. Oito episódios grandiosos em formato telenovelístico que tem mais de sátira do estado da televisão moderna que de thriller psicológico. Depois a segunda temporada, bem, a segunda temporada acho um bluff gigantesco e quase ofensivo que só vale mesmo pelo enorme Kyle MacLachlan que consegue levar a série aos ombros mesmo quando esta já parece perder o seu sentido. No entanto, e mesmo se me achei enganado pelo desenrolar do segundo ano, os primeiros oito episódios são do melhor que a televisão já nos ofereceu e ainda protagonistas de um fenómeno curioso, na época Twin Peaks movia mais tinta que as teorias sobre o Lost e anos mais tarde com o mercado de DVDs e o nome Lynch bem edificado na nossa cultura audiovisual houve um renascimento do culto da mesma e novos fãs entraram no circulo de adulação à série. Engraçado que o nome Lynch foi crucial, outros grandes trabalhos do género (como o injustamente esquecido "Wild Palms - Palmeiras Bravas") não tiveram a mesma sorte.
Duas pessoas que conheço disseram em alturas e locais diferentes "God Bless Alan Ball" quando acabaram de ver o último episódio da grande saga da família Fisher criada por um dos argumentistas mais criativos do novo cinema americano, embora só tenha assinado uma obra no grande ecrã que lhe valeu logo um Óscar e um rol infindável de reconhecimentos e prémios. A série, que durante 5 anos desenvolveu a psyche dos membros de umas das famílias mais disfuncionais da televisão norte-americana, soube quase sempre manter um nível superior mesmo se cada episódio caísse mais nos berros e nas queixas de Nate, David, Brenda e Claire do que propriamente nas resoluções dos seus problemas, mas não sei como seria de outra forma se isto são personagens que passam a maior parte do tempo a invocar os seus fantasmas do que a fazer propriamente alguma coisa para se salvarem. Daí grande parte do encanto daquela última sequência onde, pela primeira vez, alguém dá um passo em frente e procura salvação, ou, como canta a Sia na mesma sequência, exige salvamento.
Há qualquer coisa que não devia funcionar nas aventuras do Jack Bauer. O cuidado com o tempo é por vezes espalhafatoso (não há crepúsculo, passa logo de sol radiante para o breu da noite), os lapsos temporais de cada série fazem com que a personagem principal devesse ter agora quase 65 anos e aquela terceira temporada é muito estranha no plano narrativo.
Mas a acção perdura e a série consegue um recorde de "cliffhangers" impressionantes que eu não consigo deixar em passar em branco. É uma gestão impressionante de situações onde o término de que tudo que pode correr mal, correrá, consegue ter outra dimensão e quando se atinge o "worst case scenario" quem é a única pessoa capaz de resolver a situação? Jack Bauer, apoiado pela sua mega-equipa de nerds da CTU na des-humana luta contra terroristas que todos os anos querem eliminar metade da população de Los Angeles ou simplesmente assassinar o senador/presidente/senador David Palmer. É televisão excitante que nenhum mal faz e 1 hora por semana bem precisamos de nos sentar na beira do sofá à espera que o Jack se desembrulhe daquela situação que parece não ter resolução possível mas que ele lá encontra forma de nos surpreender.
E que dizer do enorme Keifer Sutherland que descobriu aqui papel para a vida inteira e sina para qualquer type-casting futuro? E na terceira série o nosso Joaquim de Almeida num tremendo over-acting? E a Elisha Cuthbert a...bem, a mostrar uma carinha laroca nunca fez mal a ninguém.
E terminada a primeira temporada entra Heroes no panteão das melhores séries tudo porque é sempre um prazer ver uma homenagem à nova-cultura geek em tão grande escala. Confessou Tim Kring, o criador, que a equipa de argumentistas visita frequentemente forums sobre a série para saber a opinião dos fãs e ter ideias para resoluções futuras. Merece mesmo uma análise em como a contra-cultura está directamente relacionada às altas entidades artísticas nos dias de hoje e que nalguns casos uma não existe sem a outra. Mas a série propriamente dita merece outra espécie de elogios. Primeiro saber gerir bem os mistérios e não deixar em desespero os seus fãs (síndrome LostTwin Peaks) e depois o facto de como um simples lugar-comum da cultura da banda-desenhada norte-americana pode ainda dar lugar a uma original, interessante e viciante história. Pontos positivos ainda para o grande Hiro Nakamura, o japonês que controla o espaço e o tempo, que mesmo sendo uma personagem secundária basicamente rouba o espectáculo todo e consegue ser cara mais memorável e adorável da série. É o perfeito exemplo da qualidade da televisão norte-americana em comparação à pobreza de muitos blockbusters do grande-ecrã: como fazer uma história com super-heróis, com bons efeitos especiais sem recorrer à pobreza da gestão bidimensional das personagens.
Quem não viu não sabe o que está a perder e deve JÁ pôr as mãos nesta primeira temporada que acabou. Quem já viu sabe do que falo e anseia por Outubro quando se vai saber como vai continuar as aventuras de Hiro, dos irmãos Petrelli, da bela Claire, etc.
Duarte & Cª; Wild Palms; Twilight Zone; Alfred Hitchcock Presents...; Taken; Amazing Stories; Lost; O Polvo; Riget - O Reino; Firefly
Sitcom/comédia
A série que nos trouxe o monstro Ricky Gervais e parece que tudo o que de lá saiu é moldado em material de primeira qualidade. Mas primeiro está Ricky, ou melhor, David Brent. O patrão mais execrável da história da televisão britânica é rei e senhor de situações de comédia tão constrangedoras que já não se via desde o enorme Alan Partridge do Steve Coogan ou o histórico e hilariante Basil Fawlty do John Cleese. Dói ver aquela pobre alma que é logo descrita no fim do primeiro episódio pela sua secretária como "you sad pathetic little man". Desde então é sempre a descer.
No futuro, e depois do fabuloso especial de Natal, Ricky trouxe Extras outra vez com o seu argumentistas companheiro Stephen Merchant que desta vez entra como actor, num resultado fabuloso para fãs dos dois. O remake americano com Steve Carell no papel de David Brent é, imagine-se, fabuloso (ou nem fosse apadrinhado pelo próprio Gervais que ainda escreveu um ou outro episódio); Martin Freeman saiu do escritório para se tornar num óptimo actor de cinema com a honra de ter sido um óptimo Arthur Dent na adaptação cinematográfica de "Hitchhikker's guide to the galaxy". E Gervais, esse passeia-se sobre os seus louros, merecidamente, e deixa-nos na expectativa do seu próximo projecto já que, até agora, tudo o que ele toca se transforma em ouro.
Devo ter alguma coisa por personagens detestáveis. Ele é David Brent, ele é Alan Partridge, ele é Black Adder. Mas admita-mos que destes todos o seu mestre é o único e incomparável Basil Fawlty, o dono de um hotel no centro de Inglaterra, racista, xenófobo, pomposo, ignorante e tudo o que pode haver de pior. É incrível como é que aguentou tanto tempo a gerir um hotel com a sua mulher se ele, literalmente, detesta todos os clientes que por lá passam e pior ainda, faz questão de o dizer. No fim ele consegue mover a série inteira só por abrir a boca, só porque imitar Adolf Hitler à frente de um grupo de hóspedes alemães. Nunca as comédias de situação conseguiram criar settings tão caóticos em apenas dez minutos e o pior é que no fim nada está bem e as personagens não se sentam à volta a fogueira a cantar, não, normalmente os hóspedes fogem e deixam o Basil numa posição embaraçosa à frente da sua mulher e de outros clientes, aos berros e a mal dizer tudo e todos porque nunca a culpa é dele.
Aliás, só por si, só pelo John Cleese na pele de Basil, que a série tinha tudo para funcionar mas o que acabou por se transformar foi num fenómeno que ainda hoje é inspiração para novos projectos britânicos, americanos e mesmo em Portugal.
O sentimento de "feel-good" atravessa todos os poros desta série ao ponto da personagem principal, o Doutor John Dorian ou J.D. (um óptimo Zach Braff), parecer por vezes a criatura mas irritantemente feliz do planeta. E quando isso acontece entram os outros, entra o alter-ego de JD na papel do Doutor Cox ou o nemésis Janitor e a série salva-se de se tornar num arraial de boas intenções e consegue mesmo dar lugar ao humor negro e nonsense mas sempre com boas intenções, sempre. Gosto do Bill Lawrence que já tinha provado com o óptimo Spin City - aquela série de comédia com o Michael J. Fox passada nos bastidores da câmara municipal de Nova Iorque - que é um óptimo argumentista de comédia sem recorrer à escatalogia, à piada fácil ou à crítica social. O seu estilo de escrita à clássico mas bem definido e é nesse aspecto que Scrubs parece ser onde ele está como um peixe no oceano. Todos as histórias começam com as personagens em total harmonia, há um inciting incident pouco tempo depois, um segundo acto bem estruturado, um clímax (principalmente com uma boa música na banda sonora a passar) e a resolução do problema dramático e pronto, alguém aprendeu a lição e tudo ficou bem. É extremamente académico mas nada disso serve de empecilho para melhor tomar partido da série, principalmente porque esta sabe parodiar-se a si mesma e transmitir boas intenções aos seus espectadores. Nada melhor para uma vez por semana durante meia-hora e a verdade é que no fim de cada episódio sentimo-nos muito zen e com a impressão que não há nada de mal neste mundo.
A série que chegou viu e venceu quando ninguém estava à espera. Um baú de personagens e catchphrases mais prolífero que os Monty Python e um dos símbolos da televisão americana da década passada. E isto tudo para falar sobre...nada. Acredito que ainda hoje Jerry Seinfeld e os seus companheiros se riam em como conseguiram levar a sua avante e pôr toda a gente a dizer "NO SOUP FOR YOU" sem saberem mesmo porquê. Quer dizer, não é que antes tivéssemos visto personagens a chegar, aleatoriamente no meio de uma história, a dizer que vão abrir uma loja para vender a parte de cima de queques. Vêem onde quero chegar? Jerry Seinfeld e companhia faziam parte de uma parada de situações sem sentido que numa outra sitcom qualquer viriam da boca da personagem idiota, e aqui são motor para episódios de pura comédia genial que tudo vai buscar à tradição stand-up do seu protagonista principal. Conscientes do sucesso e, principalmente, do fenómeno que a série era, Larry David e Jerry Seinfeld fazem o impensável e passam a escrever sobre, imagine-se, uma cadeia de televisão apresentar uma ideia a Jerry Seinfeld para este fazer uma série sobre a sua vida, isto é, sobre exactamente nada! Quer dizer, se até ali andavam a escrever sobre eles mesmos e as suas experiências de vida (Jerry é...Jerry, Kramer é uma personagem famosa da cena de Nova-Iorque e George Constanza é Larry David) então o passo mais óbvio seria passarem a escrever sobre o dia em que alguém na NBC teve a estúpida ideia de pedir a estes dois para fazerem uma série sobre eles próprios. Estúpida porque nunca ninguém no seu perfeito juízo alguma vez faria uma coisa do género mas felizmente houve um executivo daa NBC que naquele ano não tomou os seus medicamentos e foi a nossa cultura que ficou a ganhar.
Depois de um final que deixou saudades e das pausadas edições em DVD da série, os fãs puderam assistir ao nascimento de Curb Your Enthusiasm, uma espécie de Seinfeld só, e com, sobre Larry David. E até agora, em cinco temporadas, parece estar-se a edificar como uma das melhores séries de comédia do novo humor americano.
A minha escolha das melhores séries de comédia parece faltar muitos pesos-pesados e apresentar nomes que ainda não parecem ter ganho estatuto necessário para estar nos 5 finais. A escolha tem a sua razão, assim consigo um apanhado de cinco séries diferentes que caracterizam cinco tipos diferentes de fazer comédias de situação.
De todas estas, a que é capaz de ser a mais desconhecida em Portugal, é esta. Esta pérola criada por Mitchell Hurwitz e produzida por Ron Howard foi infelizmente cancelada pela Fox, canal que a trasmitia, embora tal tenha levado a uma série de gags delirantes no decorrer da terceira e última temporada num belo caso de televisão satírica de intervenção contra a mão que os alimentava que nem o Matt Groening no Futurama se lembraria.
Arrested Development começa com a introdução de uma família do mais disfuncional desde os Jacksons. Quando o pai, George Sr. Bluth, é preso por fraude económica, traição à pátria e mais uma série de delitos, é o seu segundo filho, Michael Bluth, que tem que cuidar da família e da empresa - a mãe Lucille Bluth é uma socialite com um grave problema com o alcóol, o irmão mais velho G.O.B. Bluth (pronuncia-se Job) é um mágico falhado, o irmão mais novo Buster Bluth sempre viveu protegido pela mãe o que fez com que seja um inadaptado social com um severo caso de complexo de Édipo, a irmã gémea de Michael, Lindsay Bluth, outra socialite que adora manifestações sociais e é casada com um actor "wannabe" ex-psiquiatra (ou analrapista...sim!), Tobias Funke, com quem nunca teve sexo embora tenham uma filha, Maybe Funke por quem o filho de Michael, George Michael Bluth, está apaixonado embora esta seja sua prima. E isto é só o setting dado pelo primeiro episódio e a partir daí as coisas passam a desenrolar-se com contornos ridículos. Tudo bem narrado pelo próprio Ron Howard (terá sido a melhor coisa que Ronnie fez desde os seus tempos de Happy Days) num belo retrato da América rica do pós 11 de Setembro. São imensas as referências à Enron, Martha Stewart, guerra no Iraque + procura por Bin Laden, o Star Wars Kid uma hilariante aparição daquele pobre chinês que foi ao American Idol cantar uma música d Ricky Martin, entre outras. É uma série que daqui a 10 anos podemos voltar a ver e relembrar alguns dos elementos mais importantes da cultura pop do ínico do século mas, acima de tudo, a tristeza que é não podermos voltar a ver mais nada sobre os Bluth assim que termina o genial último episódio. Participações especiais de Zach Braff, Ben Stiller, Julia Louis-Dreyfus e Charlize Theron (esta brilha com a sua personagem) embelezam ainda mais aquela que é, infelizmente, a melhor série de sempre a ser cancelada!
Quem não viu que vá já buscar e se converta. Quem já testemunhou admita que depois de ler isto até apetece voltar a ver tudo de uma vez só.
(Um dos realizadores da série apresenta a sua estreia no cinema com Michael Cera (George Michael Bluth) no filme Superbad cujo trailer já anda por aí e parece ser óptimo, para além de vir da mente dos criadores do muito injustamente subestimado 40-Year Old Virgin)
Cheers; Frasier; Herman Enciclopédia; Monty Python's Flying Circus; Black Adder; Densha Otoko; Freaks & Geeks; Não és homem não és nada; That 70s Show; Get Smart; Family Ties; Spaced; Green Wing; Royle Family; League of Gentlemen
Animação
Fácil. Fácil de mais para começar a falar das melhores séries de animação feitas porque não se podia começar por outra coisa se não aquela que foi recentemente escolhida pela revista Time como a melhor série de sempre (animação ou live-action) e poucos são os que podem contestar essa decisão porque nenhuma outra obra teve o impacto social que a família amarela de Groening teve. Aliás, se se fizesse um apanhado dos anos 90 durante um único minuto uma das imagens que teria de aparecer seria a cara de Bart Simpson ou a grande pança de Homer. Tira-se o chapéu, principalmente porque na minha modesta opinião as últimas séries não têm sido mais fracas mas simplesmente rotineiras e pouco conscientes que as pessoas já se habituaram aos Simpsons. Mas continuam a ser boa televisão, ainda, 18 anos depois da chegada do cão Santa's Little Helper que terminou o primeiro episódio nesse longínquo Natal de 1989. E ainda mais, esta 18ª série teve excelente episódios ao nível de uma, 7ª temporada.
A par disso não consigo dizer mais nada de novo sobre esta série sem descarregar o meu amor ao Matt Groening e a sua equipa que basicamente FIZERAM a televisão do novo século. Sem esta saga os anos 90 não parecem fazer grande sentido e eu ainda tenho pesadelos do dia em que a Fox puxar a ficha e cancelar de vez e eu nunca mais poderei testemunhar Homer, Marge, Bart, Lisa e "a outra". Enquanto isso tivemos o filme que é uma óptimo apanhado de tudo o que a série tem de bom e capaz de agradar os verdadeiros fãs. Sim, não é tão magnífico como South Park: Bigger, Longer and Uncut foi, mas porra, os Simspsons estão connosco há quase duas décadas, o topo do mundo já foi atingido por eles e agora só se pode esperar por qualidade. Aliás, o The Simpsons Movie é capaz de ser dos filmes fui com menos expectativas de ser assim um obra surpreendente que me desse um murro no estômago, eu só esperava por hora e meia de Simpsons e foi uma hora e meia de Simpsons que recebi. E isso, para quem me conhece, é para mim sinónimo das melhores horas e meia que posso ter.
O melhor do segundo trabalho televiso de Matt Gronening é que consegue completar o universo Groeninguiano que The Simpsons não podia mexer a bem da "suspension of disbelief". A verdade é que ele confessou adorar duas realidades da televisão norte-americana clássica - a família norte-americana e a ficção-científica logo é fácil relacionar isso mesmo com a própria dimensão do storytelling, da representação real ao fantástico. Futurama é tudo aquilo que The Simpsons devia ser caso se passasse no ano 3000 e só esse simples facto abre caminhos para uma dimensão nova do humor Groeninguiano que nunca tinhamos experimentado. É mais do mesmo, mas esse mesmo vem nm novo pacote, fresco e saídinho da vaca portanto ainda saboroso e preparado a experimentar. Infelizmente a Fox não se contentou por não ter ali um novo fenómeno mundial e não quis manter um delírio de sub-cultura durante muito tempo e lá cancelou a série ao fim de 4 temporadas. Felizmente que Groening e Cohen (a dupla atrás do conceito) sabiam que ainda tinham muito que explorar nas aventuras de Fry, Leela, Bender e Zoidberg e vai daí prometeram uma série de filmes direct-to-video cujo primeiro deles todos chega às prateleiras norte-americanas no próximo mês e o trailer apresentado na ComiCon de San Diego mostrou duas coisas: Fox = pôia e que aquelas personagens ainda têm muito para nos dizer. Eu espero a salivar, prometo.
Pronto, confesso que adoro quase tudo o que sai da fábrica dos The Simpsons mas tentem provar que estou errado e que quem aprendeu a matéria lá saiu tão ou melhor preparado que um actor de comédia que começou no Saturday Night Live. David X. Cohen é uma das mentes de Futurma, Conan O'Brien...é o Conan O'Brien, Brad Bird é O melhor realizador de filmes de animação (Iron Giant, The Incredibles e recentemente Ratatouille) e depois Al Jean, Mike Reiss e Jon Vitti juntaram-se a uma série de animadores da melhor série de sempre (sic) para criar uma pequena pérola chamada "The Critic" que passou ao lado de muita gente, principalmente do nosso país. Jay Sherman (Jon Lovitz) é um Nova-Iorquino que é crítico de cinema embora seja complicado ele sair contente de qualquer filme ("This gets the highest score, 7 out of 10") e junta o seu programa de cinema semanal género Lauro Dérmio meets Roger Ebert com a sua vida cosmopolita ao lado do seu filho e do seu pai quasi-demente. A série durante as duas temporadas que passou serviu como uma bela paródia ao trabalho do execrável crítico de cinema qual bloguista a tentar cruficar a Kathleen Gomes enquanto podem, recriando maneírismos da crítica norte-americana, provar o seu desprezo por alguns trabalhos de cinema que por lá estreiam. É mel para cinéfilos, a série que infelizmente a ABC e a FOX (quem mais) não quiseram dar seguimento. Uns anos depois saíram na internet uma série de delirantes episódios grátis especiais que se baseavam somente no programa de Jay Sherman em que ele sentado na sua cadeira satirazava alguns filmes estreados na altura, de X-men 2 aos primeiros Harry Potters ou mesmo o mui gozável Pearl Harbour. Merece ser descoberta aquela que foi a primeira série analisada pelos históricos Gene Siskel e Roger Ebert no seu programa Siskel & Ebert em que recebeu Two Thumbs Up e proporcionou que os dois fossem convidados a se interpretarem a si mesmos num óptimo episódio da segunda temporada.
A uma certa altura, já o maior trabalho de Trey Parker e Matt Stone tinha reconhecimento de público e crítica e ainda um GRANDIOSO filme já adorado por todos, South Park atinge um ponto épico impensável mesmo para os seus fãs. Estamos mesmo no começo da quinta temporada e Eric Cartman, a criança que menos simpatia transmite desde que a televisão foi inventada, participa num duelo com um outro rapaz para ver quem faz o melhor chilli e no decurso da prova (em que cada um come o chilli do outro) Cartman revela como trocou as voltas ao companheiro anulando o plano que este tinha em dar de comer ao pequeno Eric um chilli com pêlos púbicos. Mas ainda vai mais além e num magnífico monólogo com o humor mais negro que nem os inagualáveis da Liga de Cavalheiros se lembrariam, Cartman explica calmamente e sem pressas como matou os pais do seu inimigo, triturou-os e assim fez o chilli que o rapaz está a comer. Eric Cartman deixou de ser aqui o responsável por pequenas brincadeiras ingénuas e tornou-se uma epítome de sadismo, o gajo, uma criança, participa num acto deliberado de homicídio e canibalismo. Como se a cena não fosse já maldita o suficiente, a criança começa a chorar em pânico sob o olhar petrificado de toda a cidade que está a assistir aos acontecimentos e que faz Cartman? Levanta-se, vai ter com o rapaz e LAMBE-LHE AS LÁGRIMAS!! Jesus, como eu não queria acreditar no que estava a ver, Trey Parker e Matt Stone tinham no início da sequência elevando a fasquia do seu humor doentio mas estavam a perder o controlo e então chega a "cherry on top", atrás aparecem os Radiohead (voz dos mesmos) a gozar com o pobre coitado que chora e a chamarem-no de maricas. O episódio termina aqui e eu ainda demorei uns minutos até voltar a fechar a boca e a única coisa que me sai depois foi uma leve gargalhada seguida de uma onomatopeia de espanto. South Park sempre serviu de exorcismo para qualquer bom ser-humano com algum sentido de humor mas o que tinha acabado de ver era um passo tão à frente que só daqui a vários anos é que lhe darão devido valor. Porquê esta revisão da melhor cena de sempre de uma das melhores séries de comédia de sempre? Pois é ela que demonstra que nada é sagrado para estes dois verdadeiros "enfants terribles", que a sua obra para a posteridade continua para surpresa de todos a disparar em todas as direcções e a ganhar inimigos por onde passa. E já vão uns 10 anos e até hoje ninguém pode negar que o mundo bem que andava a precisar destes dois.
Infelizmente pouca gente percebe a beleza desta série. Não há aqui nenhuma intenção de um retrato satírico da América de hoje (i.e. The Simpsons) nem atirar gags à parede para ver qual pega (i.e. Family Guy). Aliás, de todas as séries de animação, King of the hill deve ser aquela que podia muito bem ser feita em live-action mas assim podia tornar-se mundana. A caricaturalidade das suas personagens parece bater com a mundanidade das suas histórias, quer dizer, isto são personagens do mais sulista que se pode imaginar, há aqui material para escatalogia nonsense e para bater ainda mais no nervo da América ignorante-republicana. Mas Mike Judge adora as suas personagens e só lhes quer bem, apesar de tudo aquelas pessoas simples e com problemas simples existem e mesmo se não conheço nenhum redneck como os que vemos nos filmes, conheço e prezo bem as suas versões portuguesas.
Mike Judge, esse deixa a sua escola (SNL; Beavis & Butt-head) à porta e apresenta só uma sitcom com rednecks, nada mais que isso, da mesma forma que Sex & The City bem representa a mulher nova-iorquina rica e sofisticada, também aqui se sabe pegar no redneck e valoriza-lo sem rídiculos mas com boa comédia. Espreitem ainda o interessante Office Space também da autoria de Mike Judge.
The P.J.s; Dr. Katz; Robot Chicken; Robin
A pedido de várias famílias (i.e. duas pessoas) este blog volta às lides de analisar filmes que vou vendo. Todos os posts anteriores desapareceram por já se encontrarem datados mas se tudo correr, e eu ainda aqui estiver nos próximos meses, voltarei a falar de alguns dos filmes que já tinha aqui analisado. Esta lista das minhas 5 séries preferidas dentro de três género distintos veio a propósito de um desafio do meu grande amigo Ricardo Gonçalves (CineArte) e assim decidi re-abrir aqui as hostes. Que venha a festança agora.
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