de John Carpenter
Tenho pena de quem não consegue ainda levar a sério John Carpenter e o reduz à série B e falta de carisma (como se fosse possível). Faz-me lembrar François Truffaut que admitia o amor ao cinema como principal característica de um bom filme, a paixão do seu criador à arte que lhe serve de veículo e abstenção dos lugares comuns da cinefilia de modelo de obras que por muita seriedade que possam ter acaba como ver três episódios seguidos das séries do Seth MacFarlane - um é giro e os seguintes exactamente iguais e aborrecidos.
Mesmo os últimos de Carpenter, excluíndo os fabulosos episódios da série Masters Of Horror, foram muito incompreendidos por novas gerações de cinéfilos que falharam completamente as referências contidas. Lá estão Vampiros e Fantasmas de Marte na lista dos melhores westerns dos anos 90 e do melhor que John Ford já fez desde que morreu.
Mas apesar de toda essa indiferença ninguém tira a Carpenter os seus primeiros filmes e o valor que estes tiveram que serviram para ele ter o direito de usar o seu nome nos seus títulos, poucos o merecem mas Carpenter trabalho para isso. Apesar do culto que corre em filmes como Escape From New York, The Thing e Big Trouble In Little China a incisão cinematográfica do realizador não pode ser escondida. A verdade é que todos os seus filmes requerem uma vasta análise da estética para se chegar à verdadeira intenção, assim como em todos os filmes de todos os grandes realizadores intocáveis.
The Fog é um caso interessantíssimo nesse aspecto. Era o seu quarto filme a estrear nos cinemas e está mesmo no centro daquela fase impressionante entre Assault To Precint 13 e They Live naquilo que foram oito filmes (estou propositadamente a excluir dois cuja qualidade não se compara a estes) em doze anos numa caminhada que só equiparável aos tempos áureos de Alfred Hitchcock. Mas acima de tudo era a edificação de Carpenter como verdadeiro artista da mise-en-scene. Pela primeira vez está Carpenter sozinho, sem referências, sem devoção aos seus mestres mas só ele.
Tudo decorre na pequena cidade costeira de Antonio Bay. Um padre descobre um diário com cem anos que fala de uma tal maldição; uma locutora de rádio local vai dando música e ajudando os barcos que se aproximam da baía e ainda trata do seu filho; um homem dá boleia a uma mulher e os dois apaixonam-se, etc. Todos têm o seu papel mas ninguém toma as rédeas para controlar a catástrofe que cai sobre a cidade - no dia do centenário de Antonio Bay um nevoeiro brilhante dirige-se para a cidade e assassina quem se encontra dentro dele, uma série de mortos-vivos provenientes de uma colónia de leprosos do século passado procura vingança de todos os responsáveis pelo encalhar do seu barco.
Nenhuma das personagens toma o papel do herói interveniente mas todas fazem o melhor para sobreviver a maldição, dito isto o filme é pautado por montagens paralelas atrás de montagens paralelas onde cada interveniente tem uma experiência diferente. A locutora, por exemplo, uma magnífica Adrienne Barbeau, luta contra os mortos-vivos sem nunca saber na realidade o que os trouxe e qual a génese do ataque enquanto o padre, a presidente da câmara e mais uma série de peões se escondem na igreja preparados para o ataque final. Os dois caso entre-ajudam-se constantemente com as sequências a cortarem entre si como se Carpenter tivesse um controlo remoto na mão e nos mostrasse aos poucos, e cada um na sua vez, os destinos diferentes de toda a gente. O melhor é que o não termos tempo suficiente para nos relacionar-mos completamente com todos (no entanto todos têm características personalizadas) faz com que as trocas de Carpenter na montagem criem uma atmosfera verdadeiramente aterradora e eficaz. Pioneirismo no seu melhor e haverá maior paixão pela 7a arte que este respeito pelo público e pelas suas personagens?
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