Thursday, 20 September 2007

Tudo Isto É Cinema I

THE APE MAN (1943)
de William Beaudine


Quem viu Ed Wood de Tim Burton apanhou um espectacular relato dos últimos dias de Lugosi quando a sua carreira estava já em putrefacção. Mas antes do histórico húngaro ser ofendido por Abbot e Costello já este era um actor secundário de veículos para Boris Karloff e isso era pautado com graças de protagonista em filmes tão maus que cada vez mais o atiravam para o esquecimento colectivo, ao contrário do seu nemésis Karloff. Infelizmente este Ape Man faz parte desse segundo grupo de filmes e daí talvez não tão infelizmente porque a falta de qualidade de toda a produção quase que consegue ofuscar o Lugosi ridículo nunca ameaçante e numa maquilhagem que só faz parecer que ele tem uma barba de Hamish em vez de o fazer parecer com uma criatura metade-gorila/metade-humano.
A história começa com duas vertentes, a irmã de Lugosi regresa à cidade deste para descobrir que o irmão cientista serviu de cobaia para as suas experiências com um gorila e é agora metade animal selvagem e ao mesmo tempo uma personagem estranha avisa um jornalista do que se passa na casa do cientista louco numa qualquer relação com fantasmas. Lugosi começa a percorrer a cidade à procura de vítimas para extrair o liquido cefaloraquidiano das suas vértrebas e assim poder curar-se e por curar digo deixar de andar curvado como um gorila. Enquanto isso o jornalista lá deixa umas piadas machistas à sua fotógrafa, a polícia tenta descobrir o paradeiro de Lugosi e aquela personagem estranha do início aparece quando lhe apetece e no fim embrulha tudo na resolução mais estúpida que há memória.
E Lugosi que mete pena ao continuar a manter o seu forte sotaque húngaro que tão bem funcionava no Drácula mas aqui serve de cereja no topo deste desastre do terror dos anos 40.
Mas há uma boa forma de ver este filme, numa sessão dupla com outro do género com um grupo de cinéfilos que também têm especial carinho por Lugosi. Aí este Ape Man começa uma grandiosa noite de cinema esquecido.

LADY SNOWBLOOD (1973)
de Toshiya Fujita


As histórias de vingança foram proeminentes na maioria dos filmes de acção asiática mais importantes. Como The 36th Chamber Shaolin dos estúdios dos irmãos Shaw ou mesmo mais recentemente Oldboy do sul-coreano Chan-wook Park trataram de recorrer ao tema do herói sem rumo para além do seu objectivo principal de vingança dura e fria. Lady Snowblood acaba no entanto por ser o mais estilizado destes três e talvez ainda o mais cru.
Nascida numa prisão, Shurayuki-hime é criada e treinada desde de criança com o objectivo de vingar a morte do pai e do irmão mais velho e das constantes violações que a mão foi submetida antes de ser presa e morrer durante o parto. Os quatro capítulos que dividem a história são para cada um dos intervenientes que Yuki tem que assassinar para assim cumprir o seu objectivo de nascença percorrendo o país até, da forma certa, conseguir fazer a justiça da espada. Incrivelmente a sua personagem não aprende nenhuma lição de vida, cada capítulo começa com a calma de Yuki à procura da próxima vítima e termina com um duelo sangrento, daí que o único desenvolvimento seja feito de retrospectivas do seu passado (o treino duro, a história que a sua mão conta antes de morrer) e de uma cena perto do fim em que ela não sabe o que vai acontecer agora que o seu objectivo de vida foi cumprido.
É assustador ver uma história de vingança com uma personagem que não parece tirar nenhuma moral da mesma embora nos digam a meio do filme que Yume ainda tem uma réstia de sentimento em si e admita-se que é suficiente para aceitarmos esta personagem em toda a sua glória.
Magnífico filme de artes marciais com cenas de acção hiperbólicas e sangue a jorrar como se se tratasse de um filme de animação japonesa. Lady Snowblood acaba por isso ser a estrutura para Tarantino fazer o seu díptico de vingança também com uma mulher a ter que assassinar os quatro principais intervenientes de uma catástrofe em que ela esteve directamente envolvida. Há mesmo planos de Kill Bill que foram copiados a papel químico de Lady Snowblood mas a homenagem atinge carácter de devoção quando Tarantino usa no final do primeiro volume a música principal do filme japonês.
A descobrir urgentemente ao lado de The 36th Chamber Shaolin.

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