The Isle (2001)
de Kim Ki Duk
No começo do novo século era o cinema japonês que andava a mexer com o mundo. Não só no género do terror cujas novas normas foram inventadas pelo país do sol nascente (e desde então repetidas em todo o lado ad nauseum) mas também no reconhecimento crítico noutros pontos desde que Takeshi Kitano refazia os filmes dos yakuza no anos 90. A Coreia do Sul era apenas a "irmã mais nova"que se limitava a tentar aparecer no renascido mercado asiático. Não foi preciso esperar muito tempo para que o sul-coreanos chegassem à pole-position, se revelassem mais inovadores e são agora vários os realizadores desse país que os amantes do cinema asiático seguem com devoção, e cada vez menos artistas japoneses na lista.
Um dos pioneiros foi Kim Ki Duk que com este O Bordel Do Lago (triste título português dado, provavelmente, por quem não prestou atenção ao filme) anúncio a sua incursão pelo ecrãs mundiais numa carreira que até agora só se prova como muito bem sucedida.
A maior curiosidade foi como este filme entrou no mercado internacional, dentro de pacotes de cinema fantástico, que mais tarde, com os filme seguintes de Ki Duk, o catálogo seria provado erróneo quanto à verdadeira natureza do realizador. Compreendo porquê, no mesmo ano audition de Takashi Miike estava a fazer os mesmos festivais e as comparações entre os dois eram inevitáveis - os dois são duas histórias de amor condenado pautado por várias cenas de mutilação e tudo com um background daquela sensibilidade asiática que parece por vezes inatingíveis para nós, europeus.
A diferença entre os dois prova, no entanto, que o sul-coreano não se iria ficar pelos filmes de culto fantástico: os sentimentos das personagens de Ki Duk são centrais à narrativa e as cenas de mutilação somente consequências das suas acções.
Passado num enorme lago na Coreia do Sul onde homens se retiram para pequenas casinhas flutuantes espalhadas pelo centro do mesmo, Seom segue a jovem rapariga muda que trata dos ricos pescadores - leva-os para as suas respectivas casas no seu pequeno barco, transporta as prostitutas que eles encomendam por uma noite e por vezes dá ela favores sexuais por uns trocos mais. A chegada de um homem misterioso que não vai lá para pescar muda a rotina dela que se começa a apaixonar por ele aos bocados. E enquanto o tempo passa e eles se vão entre ajudando acabam por descobrir até onde são capazes de se auto-sacrificarem para que se possam escapar das consequências dos seus actos.
A falta de diálogos pelas personagens principais leva a acreditar que para Ki Duk a palavra é um bem desnecessário, quando o próprio protagonista descobre isso executa uma acção chocante que não por salva a sua vida como o aproxima da rapariga. Mas é Ki Duk quem prega essa filosofia, o seu filme é contemplativo mesmo em cenas de violação ou quando as personagens usam anzóis para outra coisa que não pescar.
Mas poderoso é o final, o último plano deixa o público a coçar a cabeça com a metáfora apresentada. Ki Duk gere tão bem a história que quando nos dá aquela conclusão obriga-nos a uma reflexão sobre o sacrifício espontâneo numa belíssima conclusão para esta história contemplativa.
Oldboy (2003)
de Chan-wook Park
Foi já há quatro anos que o cinema sul-coreano se edificou nas massas de uma forma que nem os contemporâneos japoneses tinha conseguido. E a grande confirmação foi este tour-de-force que já foi tão falado e escrito que é difícil encontrar alguém que goste de cinema que nunca tenha visto este segundo capítulo da trilogia da vingança de Park.
Baseado num manga japonês, Oldboy segue Oh Dae Su desde o dia em que é raptado nos anos 80, encarcerado num pequeno quarto, libertado 15 anos depois e a procura da vingança pelo responsável desse acto barbárico que o destruiu a sua vida. Mascarado pela vingança cega de Dae Su (cuja complexa resolução final revela um ainda maior acto de vingança do prevaricador final) o filme contrasta as duas Coreias-do-Sul, a sub-desenvolvida dos anos 80 e a nova moderna quase grande potência económica mundial. Com reflexos da antiga subjugação japonesa, a nova Coreia Do Sul é um local desconhecido para Dae Su da mesma forma que é para quem ainda se lembra do jovem país ocupado por forças japonesas antes da IIª Grande Guerra e como o país que renasceu das cinzas ainda guarda um certo rancor pelo passado, ironia das ironias, esta história-reflexo da Coreia parte uma premissa escrita por japoneses.
Ao longo dos anos Oldboy tem percorrido o mundo e encontrado fãs em todo o lado. De Tarantino que deu a Park o Grande Prémio do Júri em Cannes ao fenómeno criado por novos cinéfilos que elevaram este filme não só ao culto mas também ao panteão dos melhores filmes desta nova década. Dou-lhe todo o valor, claro. A dureza, e principalmente, frieza da história é elevada ao cubo na personagem de Dae Su, um protagonista que nem na categoria de anti-herói se consegue inserir é um bêbado desgraçado no começo e termina como alguém sem valores nenhuns cuja decisão final acaba por ser muito mais chocante que o próprio twist que o espera antes. Aliás, de certa forma é o vilão quem mais simpatia traz ao público, a dor que o atravessa é bem mais forte que a de Dae Su e a sua conclusão mais honorável.
Que dizer mais? Oldboy pôs definitivamente a Coreia do Sul no mapa e até agora nenhuma outra cinematografia asiática é tão excitante quanto a do sul da pequena península.
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
No comments:
Post a Comment